quinta-feira, 11 de abril de 2013

O Pai ama o Filho e tudo põe na sua mão. (Jo 3,35)

Estas palavras do Evangelho de São João, “O Pai ama o Filho e tudo põe na sua mão”, podem passar-nos ao lado, podem deixar de nos tocar, na medida em que se referem à relação entre Deus Pai e Deus Filho.
O Pai ama o Filho e por esse amor tudo coloca nas suas mãos, entrega-lhe todo o poder, a glória, o próprio mistério de salvação que o Filho realiza.
Contudo, não podemos olhar estas palavras como exclusivas ao mistério da trindade divina, à relação divina entre o Pai e o Filho, uma vez que também a nós nos dizem respeito.
Ao termos sido assumidos como filhos no mistério da Encarnação do Filho, na redenção operada com a paixão, morte e ressurreição de Jesus, também nas mãos de cada um de nós Deus Pai coloca tudo o que tem e tudo o que é.
Deus coloca-se nas nossas mãos, o que é como Pai, como fonte de vida, como fonte de amor, é-nos deixado ao nosso cuidado, é-nos entregue para que tal como na obra da criação possamos fazer crescer e multiplicar essa mesma realidade.
Também certamente se expressava neste sentido Santo Ireneu quando dizia que a glória de Deus é o homem vivo, ou seja, a glória de Deus floresce na medida do nosso acolhimento de Deus, na medida do nosso cuidado diante de tudo o que Deus coloca nas nossas mãos.
Sabemos por experiência que aquele que ama entrega tudo, não reserva nada para si, porque toda a sua existência está centrada na realização do amado. Quem ama verdadeiramente entrega-se todo, e Deus que nos ama entrega-se totalmente a cada um de nós, a cada um daqueles que ama.
Desta entrega e da sua consciência deriva uma grande interpelação, uma grande responsabilidade, porque na medida do nosso amor, da nossa fidelidade ao dom divino que nos é oferecido, se traduz e revela a imagem de Deus ao mundo e aos outros homens.
Como dizia alguém que neste momento não consigo referenciar, Deus humilhou-se de tal maneira pelo nosso amor que nós podemos desfaze-lo nas nossas mãos, que nós podemos dar uma imagem completamente falsa dele. Deus deixa-se aniquilar nas nossas mãos para que aprendamos a amar, para que não tenhamos medo do seu amor, da vida que nos oferece.
Esta ideia assusta! Pensar que tenho a possibilidade de ter Deus na minha mão e de o fazer vida ou de lhe dar a morte através da desfiguração do seu amor, não me pode deixar indiferente nem tranquilo.
É minha responsabilidade, é nossa responsabilidade, fazer crescer a glória de Deus, mostrar que Deus se revela como dom e a sua maior alegria é ser encarnação em cada um de nós.
 
Ilustração: “A Trindade”, de Garcia Fernandes, Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa.

2 comentários:

  1. Também a mim me inquieta a responsabilidade de fazer crescer a glória de Deus.Estaremos preparados? que fazer? Inter Pars

    ResponderEliminar
  2. Frei José Carlos,

    O texto do Evangelho do dia de hoje é difícil para alguns de nós, na sua compreensão, radicalidade, conquanto a leitura possa não evidenciar tal dificuldade. O texto da Meditação que teceu ajuda-nos a questionar-nos sobre a nossa relação com Deus, reconhecida em Jesus, seu Filho muito amado, sobre a nossa fé, a Palavra que escutamos e o testemunho que dela damos . Permita-me que respigue algumas passagens que me tocam. …” O Pai ama o Filho e por esse amor tudo coloca nas suas mãos, entrega-lhe todo o poder, a glória, o próprio mistério de salvação que o Filho realiza.
    Contudo, não podemos olhar estas palavras como exclusivas ao mistério da trindade divina, à relação divina entre o Pai e o Filho, uma vez que também a nós nos dizem respeito. (…)
    (…) Deus coloca-se nas nossas mãos, o que é como Pai, como fonte de vida, como fonte de amor, é-nos deixado ao nosso cuidado, é-nos entregue para que tal como na obra da criação possamos fazer crescer e multiplicar essa mesma realidade. (…)
    (…)Deus que nos ama entrega-se totalmente a cada um de nós, a cada um daqueles que ama.
    Desta entrega e da sua consciência deriva uma grande interpelação, uma grande responsabilidade, porque na medida do nosso amor, da nossa fidelidade ao dom divino que nos é oferecido, se traduz e revela a imagem de Deus ao mundo e aos outros homens.”…
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Meditação, muito profunda, que nos desinstala, pela exortação que nos deixa…” é nossa responsabilidade, fazer crescer a glória de Deus, mostrar que Deus se revela como dom e a sua maior alegria é ser encarnação em cada um de nós.”
    Que o Senhor o ilumine, o guarde e o abençoe.
    Bom descanso.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe de novo um poema de Frei José Augusto Mourão, OP

    caminho, verdade e vida

    Deus, tu és o Caminho, a Verdade e a Vida/que se dão as mãos/porque a verdade do caminho
    é a vida que a tece/e a engloba, aberta/e é a polifonia da ternura que acorda os caminhos/
    e age e cura a vida//

    tu és o caminho que precede todos os caminhos,/a visitação do corpo/no que o corpo esquece,/
    o nunca visto da paz e da alegria//

    dá a este corpo que o teu dom reúne/um instante de fome e de aflição/para que deste tempo-fora-do tempo/
    se erga a verdade dos caminhos/da nossa vida e do nosso louvor,/Deus que vens em Jesus Cristo/
    e no Espírito que nos ensina a rezar.

    (In, “O nome e a Forma”, Pedra Angular, 2009)

    ResponderEliminar