sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O Senhor elogiou o administrador desonesto (Lc 16,8)

Cada vez que nos encontramos com esta parábola não deixamos de ficar perplexos perante a sua conclusão e sobretudo perante o elogio que Jesus faz da acção desonesta do administrador. Como é possível que Jesus tenha elogiado tal gestão, tais comportamentos?
Ficamos escandalizados com o elogio de Jesus, como se Jesus elogiasse a desonestidade, esquecendo-nos que afinal o que está em causa e o que Jesus elogia é a sagacidade e a habilidade do administrador desonesto, a sua capacidade de face a uma situação de perigo, face a um futuro imprevisível e inevitável se assegurar de o viver com alguma tranquilidade, com alguma segurança.
Este elogio que Jesus faz do administrador desonesto vem de alguma forma sublinhar e colocar em evidência a incoerência da nossa vida quotidiana, o desequilíbrio que vivemos entre a fé que confessamos e a vida que levamos. Dizemos acreditar na vida eterna, uma sondagem recente à população portuguesa confirma que uma grande maioria de nós acredita na vida eterna; dizemos que acreditamos no amor de Deus, que acreditamos na validade do mandamento do amor, mas continuamos a viver no nosso quotidiano como se tais realidades não existissem, como se a nossa vida não tivesse outro fim que o nada após a morte, ou apenas uma leve memória naqueles que connosco viveram mais intimamente.
A nossa fé na vida eterna não nos deveria fazer avaliar a nossa vida de uma forma diferente, não nos deveria reorientar de modo a que o dia a dia traduzisse essa fé, essa esperança e essa confiança? Quais são as nossas orientações de fundo e imediatas, quais são as nossas prioridades? Ou pelo menos como se encaixam nelas, como as marcam essa fé que temos um futuro a cuidar? Poderíamos e deveríamos perguntar-nos sobre o que anda a ser dito de nós ao grande Senhor, que contamos prestaríamos hoje sobre o que desbaratamos na nossa vida, sobre a administração da nossa vida e dos dons que nos foram entregues.
Jesus elogia a administrador desonesto porque ele olha mais longe do que nós, olha para além do imediato, olha e tem em conta a vida futura. E esse elogio é ainda mais sublime porque olha o futuro e prepara-o num momento de desespero, num momento crítico, perante uma dificuldade que é a de ser chamado a prestar contas da sua má administração.
Nós, a maior parte de nós e na maior parte das situações, deixamo-nos levar pelos nossos remorsos, ficamos remoendo as nossas faltas, deixamo-nos afinal levar pelo nosso orgulho ferido, não somos capazes de dar esse salto de olhar para o futuro e com sagacidade e agilidade de o tomarmos nas mãos. Jesus elogia afinal esta atitude, este salto, esta esperteza que marca os filhos deste mundo e que nos devia marcar ainda mais a nós como filhos da luz e herdeiros de um mundo futuro.
Que o Senhor Jesus nos abra os olhos e nos liberte dos nossos remorsos e orgulhos para vermos e vivermos a vida futura que nos está prometida.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    “Os filhos deste mundo são mais espertos do que os filhos da luz, no trato com os seus semelhantes”. A partir desta Parábola Jesus convida os seus discípulos a imitarem na pratica do bem, como “filhos da luz”, a “sagacidade” que o “administrador desonesto” como “filho deste mundo”, usou em proveito próprio, os bens do seu senhor.
    E como o Frei José Carlos nos recorda o elogio que Jesus faz do administrador desonesto “vem de alguma forma sublinhar e colocar em evidência a incoerência da nossa vida quotidiana, o desequilíbrio que vivemos entre a fé que confessamos e a vida que levamos”, questionando-nos, profundamente, interrogando-nos sobre a sinceridade das nossas relações com Deus e com os nossos irmãos, como “filhos da luz”, quais são as nossas “opções”, “prioridades” …”A nossa fé na vida eterna não nos deveria fazer avaliar a nossa vida de uma forma diferente, não nos deveria reorientar de modo a que o dia a dia traduzisse essa fé, essa esperança e essa confiança? Quais são as nossas orientações de fundo e imediatas, quais são as nossas prioridades? Ou pelo menos como se encaixam nelas, como as marcam essa fé que temos um futuro a cuidar?”…
    E salienta-nos um outro aspecto desse elogio de Jesus …”esse elogio é ainda mais sublime porque olha o futuro e prepara-o num momento de desespero, num momento crítico, perante uma dificuldade (…)”.
    Façamos nossas as palavras com que o Frei José Carlos termina esta importante Meditação “Que o Senhor Jesus nos abra os olhos e nos liberte dos nossos remorsos e orgulhos para vermos e vivermos a vida futura que nos está prometida.”
    Bem haja Frei José Carlos. Desejo-lhe um bom fim de semana, inspirador, iluminado por Deus.
    Um abraço fraterno
    MJS

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