A festa de Santo André neste início de Advento dá-nos a oportunidade de nos encontrarmos uma vez mais com o convite de Jesus ao seu seguimento. Caminhando ao longo das margens do lago Jesus passa por Pedro e André e diz-lhes apenas “vinde e segui-me”. Pouco depois chama também Tiago e João fazendo o mesmo convite.
E eles deixaram tudo e seguiram Jesus, sem o conhecerem, sem terem visto qualquer milagre, sem conhecerem mais nenhuma palavra dele. Abandonaram tudo por nada, ou por quase nada, pois tinham Aquele que os convidava a segui-lo.
Vinde e segui-me é o mesmo convite que nos é dirigido em cada dia, neste processo de procurarmos viver na peugada de Jesus, e como a Tiago e João, a André e a Pedro, apenas nos resta a pessoa de Jesus, a garantia da sua palavra de que seremos diferentes naquilo que somos e fazemos.
Jesus convidou-os a deixar as redes da pesca para serem pescadores de homens, uma tarefa estranha e tão incompreensível quanto o conhecimento que tinham de Jesus. A nós, a cada um de nós, pede-nos que deixemos as nossas redes, signifiquem elas o que significarem, para O seguirmos e nos dedicarmos também à pesca de homens.
Para Pedro e André, Tiago e João, foi necessário experimentarem a intimidade de Jesus, conhecerem a sua palavra, passarem pela cruz e pela ressurreição, para perceberem ao que Jesus os convidava e enviava. Só depois da força do Espírito Santo puderam definitivamente deixar as suas redes de pescadores para se dedicarem à realização do convite de Jesus.
Também a nós nos faz falta essa experiência da intimidade de Jesus, esse conhecimento da sua palavra e a passagem pelo mistério da cruz e da ressurreição para sabermos como através das nossas redes, trabalhadas ou abandonadas, podemos ser verdadeiramente pescadores de homens.
A resposta para o como o fazer é um tanto ou quanto imprecisa, díspar, porque tanto pode significar o martírio como a cruzada, tanto pode significar a liberdade como a escravidão. A história da Igreja em dois mil anos mostra-nos os modos como tentámos pescar homens para o Reino de Deus e como algumas vezes com os mínimos esforços fomos capazes e outras vezes com grandes forças só cometemos erros tremendos.
Um episódio ocorrido em 1511 na ilha da Espanhola com um grupo de frades dominicanos pode dar-nos uma luz. Enviados para acompanhar os conquistadores espanhóis depararam-se com uma situação ultrajante de injustiça contra os índios e verdadeiros senhores daquelas terras. No quarto domingo do Advento de 1511, frei António de Montesinos, sob preceito formal da comunidade, prega o sermão do Percursor do Messias, São João Baptista, e face a tanta violência e injustiça, pergunta aos civilizados conquistadores espanhóis, “por acaso não são eles também homens?”. E tudo explode, critica, violência, marginalização, acusação ao rei. Os frades tinham posto em causa o mundo que tinham construído, o império sonhado e conquistado defendendo os direitos à terra de uns índios que nem sequer eram considerados gente.
Contudo, se os frades puderam colocar em causa o que viam, a injustiça a que assistiam, foi porque previamente se tinham assumido como profetas, tinham assumido ser a voz daqueles que não tinham voz, tinham assumido ser leais aos homens e fiéis a Deus. A força do Espírito para tal veio-lhes pela formação teológica que tinham recebido, o conhecimento da Palavra de Deus que tinham adquirido, mas também da ascese de vida a que se tinham dedicado. Eram pobres entre os pobres e para falarem de Deus e dos direitos dos homens naquele quarto domingo do Advento tinham passado uma semana de oração intensa, de vigília constante e de jejum.
Só confiados no Senhor e entregues ao seu poder salvador poderemos realizar o seu mandato. Colocando nele as nossas fraquezas encontraremos a sua força.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarNo dia da festa litúrgica do Apóstolo Santo André, a Meditação que connosco partilhou foi uma oportunidade de reflexão, um convite, “ao seguimento de Jesus” que nos é dirigido diariamente (...), ” a garantia da Sua palavra de que seremos diferentes naquilo que somos e fazemos.”
O “episódio ocorrido em 1511 na ilha da Espanhola com um grupo de frades dominicanos” que nos relata leva-nos a uma profunda reflexão, à comparação com a denúncia da injustiça nos dias de hoje, em contextos históricos diferentes, afinal tão pouco presente nos nossos actos individuais e colectivos. Como nos deixámos acomodar, agrilhoar nas “prisões” em que nos envolvemos, independentemente da muita ou pouca formação teológica, do conhecimento da Palavra de Deus que se tenha adquirido.
Que o Senhor nos aumente a nossa fé e reforce os laços que estabelecemos com o nosso próximo, por forma a contribuirmos para uma sociedade mais justa e digna, sem ficarmos enredados nos dons que nos foram concedidos.
Obrigada pela partilha Frei José Carlos. Faz-nos reflectir, ajuda-nos a examinar as nossas intenções e comportamentos. Bem haja.
Um abraço fraterno.
Maria José Silva