segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Libertar-se do jugo ao sábado (Lc 13,10-17)

Como sabemos, por várias passagens dos Evangelhos, Jesus não deixou de frequentar as sinagogas nem de guardar o sábado. Apesar da novidade da sua palavra e da sua missão não cortou radicalmente com o que era a tradição religiosa daqueles com quem vivia e na qual tinha nascido. Por essa razão encontramos nas narrativas dos Evangelhos vários relatos de incidentes de Jesus por causa do sábado, que para ele tinha um significado enquanto que para os seus opositores tinha outro. É o que acontece nesta passagem do Evangelho de Lucas, na qual se relata, pela imposição das mãos de Jesus, a cura de uma mulher enferma há dezoito anos, facto que provoca a indignação e condenação do chefe da sinagoga.
Partindo da condenação e crítica do chefe da sinagoga podemos apreciar como São Lucas constrói o relato e como adquire nele um papel marcante o tempo. Para o chefe da sinagoga, e face ao gesto de Jesus de impor as mãos, havia na semana outros seis dias em que tal gesto podia ser exercitado sem cair na violação do preceito do sábado.
Contudo, para Jesus mais significativo que aqueles seis dias da semana eram os dezoito anos de doença da mulher, esses dezoito anos de cativeiro no mal. Encontramos uma multiplicação dos seis por três, não de dias mas de anos, para simbolizar através desse número a incapacidade total da mulher de passar afinal a esse sétimo dia de libertação que era o sábado.
E o facto de que, pela mão de Jesus, passou a essa liberdade é a nova posição que adquire, pois passou de curvada a direita, a essa posição que no momento da criação é apresentada como sendo a do homem criado à imagem e semelhança de Deus. E como se ainda não fosse suficiente, a mulher louva a Deus pelo acontecido, ou seja cumpre a primeira e verdadeira missão do sábado, tempo e modo para louvar a Deus.
Este episódio e o seu significado não pode deixar de nos fazer pensar no nosso dia do Senhor, no nosso domingo e na forma como o vivemos. Podemos e devemos interrogar-nos se o nosso dia de descanso é um verdadeiro dia de libertação do jugo que nos prende durante os outros seis dias da semana, se ao domingo o tempo e a forma como o utilizamos serve para nos erguer, para nos colocar nessa posição vertical que nos permite ver as coisas de outra forma, se o domingo nos serve para louvar o Senhor pela libertação que nos alcançou com a sua vida e morte.
Num momento histórico em que o domingo parece passar cada vez mais despercebido no conjunto dos dias da semana, cabe descobrir como humanamente o necessitamos para não sermos apenas máquinas de produção e consumo, escravos subjugados a um sistema, mas homens e mulheres, filhos de Deus que nesse dia se encontram consigo mesmos, com os seus irmãos e o seu criador que é Pai e readquirem a dignidade que lhes é natural.



1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    O texto da Meditação que partilha connosco, no qual nos recorda uma das passagens do Evangelho de Lucas no qual é relatado a cura de uma mulher enferma há dezoito anos, na sinagoga, num dia de sábado, por Jesus, facto que levou o chefe da sinagoga a indignar-se, indiferente à cura que acabava de ver, minimizando-a, coloca-nos perante uma interrogação que nos faz reflectir sobre a forma como vivemos a nossa religiosidade e particularmente como vivemos o nosso dia do Senhor, o domingo.
    Como nos salienta ...” Num momento histórico em que o domingo parece passar cada vez mais despercebido no conjunto dos dias da semana, cabe descobrir como humanamente o necessitamos para não sermos apenas máquinas de produção e consumo, escravos subjugados a um sistema, mas homens e mulheres, filhos de Deus que nesse dia se encontram consigo mesmos, com os seus irmãos e o seu criador que é Pai e readquirem a dignidade que lhes é natural.”
    Saibamos discernir e descobrir que a verdadeira vontade de Deus, o ser cristão, se pauta pelo amor a Deus e ao nosso próximo, e não pelo cumprimento rigoroso de determinadas regras, e em certos dias.
    Obrigada, Frei José Carlos, por esta profunda Meditação que nos desinstala. Bem-haja.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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