domingo, 20 de maio de 2012

Frei Domingos Maria Frutuoso – Infância e Vocação Dominicana

No seguimento do Encontro da Família Dominicana na Ribeira de Santarém apresentamos alguns dados sobre a infância e vocação dominicana de frei Domingos Maria Frutuoso, mais tarde Bispo de Portalegre.

Tenho bastante para lhe contar a propósito da nossa Província. Serviu-me ter-se dito por um Cardeal da Santa Igreja que o Padre Domingos Frutuoso seria um dia o Patriarca de Lisboa, e foi dito em Roma a quem mo contou. Logo que o padre Theissling me comunicou que já não existia a nossa Província, escrevi-lhe uma carta, a que me respondeu, que convocara novamente o seu Conselho, e que emendaram a mão, ressuscitando a Província.
Tenho muito que contar, e gostarão de saber que pela nossa Província passei fome, para me manter fora do Corpo Santo, onde me queriam, destruindo também o que havia já feito nesse sentido. Pobre Província!”

É com estas palavras que D. Domingos Maria Frutuoso se dirige ao frei Tomás Maria Videira, numa carta datada de 22 de Maio de 1943, há portanto sessenta e nove anos atrás, e num momento crítico para a vida e restauração da Província. O que ele terá contado ao frei Tomás Maria Videira não o poderemos saber, sabemos sim o que nos testemunham os documentos, nomeadamente a correspondência de frei Domingos Maria Frutuoso, sobre a sua acção na Restauração da Província e a sua vida enquanto frade da Ordem de São Domingos.

Neste sentido, se hoje estamos aqui em Santarém, é porque os documentos nos atestam que frei Domingos Maria Frutuoso nasceu na Ribeira de Santarém, paróquia de Santa Iria, onde foi baptizado com o nome de Manuel Rosa Frutuoso.
Filho de Francisco Rosa e Ana de Jesus nasceu a 13 de Fevereiro de 1867 segundo os registos oficiais.

Contudo, e segundo palavras suas, ou melhor da sua mãe, ele não teria nascido a 13 de Fevereiro mas a 13 de Janeiro. Assim escreve ele numa carta de 2 de Fevereiro de 1918:
Vi hoje a Prima C. (…) Falou-me de se ter esquecido do dia 13, mas disse-lhe que recebi os parabéns em Janeiro e Fevereiro, porque o livro do baptismo certamente por engano diz ter eu nascido a 13 de Fevereiro, o que a mãezinha dizia não ser verdade.”
De facto e pela correspondência pessoal percebemos que frei Domingos Maria Frutuoso celebrou sempre em família a sua data de nascimento a 13 de Janeiro, dia que como ele escreveu era sempre de grande alegria para a mãezinha.
A mãe é na sua correspondência a grande referência, a grande recordação da vida familiar e seus valores, e após o seu falecimento em Lisboa a 12 de Setembro de 1908, todos os dias doze de cada mês aplica a Missa que celebra pela alma da mãe.
Já no que diz respeito ao pai encontramos apenas uma referência, e de alguma forma trágica, dolorosa, o que deixa supor um desaparecimento bastante precoce na vida do jovem Manuel Rosa Frutuoso.
Admirei-me de assistir por mais de uma hora àquele estudo, sem incómodo, como se fora médico. Depois é que me lembrei de que em tempos um médico muito distinto, fazendo curativos muito dolorosos a meu pai e a que a mãezinha assistiu, corajosa, disse que ela era uma mulher forte e uma enfermeira muito distinta.”
Também a sua irmã Venância desapareceu cedo e por isso são também escassas as referências.
Esta boa tia foi a madrinha da minha mana Venância de quem me lembro com as maiores saudades.”

Aos onze anos, Manuel Rosa Frutuoso deixa a casa materna para entrar no Seminário Patriarcal instalado em Santarém.
Entrou nessa grande instituição a 6 de Outubro de 1878 na classe dos alunos gratuitos e trazido pela mão de uma senhora que quarenta anos mais tarde encontrará e procurará para lhe agradecer.
Aluno brilhante Manuel Rosa Frutuoso concluirá o curso com distinção, ocupando por isso imediatamente após a ordenação de presbítero, celebrada a 15 de Junho de 1889, o cargo de Prefeito do Seminário.
Na ausência do Cardeal Patriarca de Lisboa D. José Sebastião Neto, foi Manuel Rosa Frutuoso ordenado pelo Arcebispo de Mitilene D. Manuel Baptista da Cunha, mais tarde Arcebispo de Braga e anfitrião das semanas de pregação em 1910 de frei Domingos Frutuoso nessa cidade.
Entre 1889 e 1893, o jovem padre Manuel Rosa Frutuoso habitou o Seminário Patriarcal de Santarém, no qual para alem de Prefeito foi também professor de canto e latim, e deu aulas particulares de geografia.
Foi também nomeado pároco de Santa Maria de Óbidos, onde nunca chegou a residir por incompatibilidade com as funções do Seminário, e parece que nem a visitar, pelo que se viu obrigado a renunciar a esse ministério após dois anos de nomeação.

Segundo a notícia que frei Tomás Maria Videira redigiu para “O Facho” em 1949, aquando da morte de D. Domingos, o interesse do jovem padre Manuel Rosa Frutuoso, pela Ordem de São Domingos terá despertado quando pelo Seminário de Santarém passou um dominicano francês, da Província de Toulouse, no rastro da vida e morte do Beato Bernardo de Morlans e dos seus dois pequenos discípulos.
Contudo, e desconhecendo a data da passagem desse dominicano francês, podemos interrogar-nos se não haveria já algum interesse anterior, e isto porque segundo a mesma crónica de frei Tomás para “O Facho”, o padre Manuel Rosa Frutuoso era já irmão da Ordem Terceira e tinha como padroeiro o Beato Bartolomeu dos Mártires.
Assim o confirma D. Domingos numa carta dirigida ao frei Tomás Videira em 1942:
As Terceiras devem assinar T.O.P.: assim é que me ensinaram quando eu entrei na Ordem Terceira com o nome de frei Bartolomeu dos Mártires.”
Outros dados a ter em conta na vocação dominicana do jovem Manuel Rosa Frutuoso é a ainda existência do Mosteiro de São Domingos das Donas na cidade de Santarém e a antiga pertença à Ordem Dominicana do Director do Seminário Patriarcal o Cónego Joaquim Moreira Pinto.

Segundo o Almanaque do Clero do Patriarcado de 1862, o Cónego Joaquim Moreira Pinto, Director do Seminário de Santarém era um antigo frade de São Domingos, um frade que no ano de 1830 vemos inscrito como colegial no Colégio de São Tomás de Coimbra.
Ter-se-iam encontrado no Seminário Manuel Rosa Frutuoso e Joaquim Moreira Pinto? É provável. Teria o antigo dominicano alguma influência espiritual sobre o jovem seminarista? Não se sabe.
Incontestável, porque confessado pelo próprio, é que Manuel Rosa Frutuoso, aos catorze anos se sentiu chamado à vida religiosa.
Eu também me senti chamado à vida religiosa desde os 14 anos, mas continuei no seminário, onde me ordenei, servindo a minha diocese pelo tempo de cinco anos, e entrei aos 26 da minha idade na Ordem de São Domingos.”

Mas se desconhecemos a influência do antigo dominicano, o mesmo já não se pode dizer do Padre Hyckey da comunidade dominicana irlandesa do Corpo Santo, visitante assíduo do Seminário Patriarcal e com quem o jovem padre Manuel Rosa Frutuoso se encontrava frequentemente. É num desses encontros, e vendo a disposição do jovem sacerdote que o Padre Hyckey lhe sugere a vida religiosa dominicana.
Uma visita ao túmulo do Venerável frei Luís de Granada na igreja de São Domingos ao Rossio fará com que algumas resistências internas desapareçam. Neste aspecto não podemos esquecer a relação extremamente forte com a mãe, que como confidencia mais tarde ficou muito desgostosa com a tomada de decisão do filho e ao ver a sua partida no dia 14 de Setembro de 1893.

No dia seguinte Manuel Rosa Frutuoso está no Corpo Santo e um mês depois, a 15 de Outubro de 1893 está a tomar o hábito religioso e a iniciar o noviciado em Saint Maximin em França.
A decisão de fazer o noviciado em Saint Maximin prende-se com o facto de ter sido ali que o padre Hyckey tinha passado alguns anos da sua vida, o que lhe permitia ter conhecimentos que orientassem a jovem vocação.
Ao professar a 15 de Outubro de 1894, Manuel Rosa Frutuoso, frei Domingos Maria, torna-se o primeiro dominicano português após a expulsão das Ordens Religiosas em 1834 a professar e a primeira pedra do edifício da restauração da Província.
Terminado o noviciado em Saint Maximin frei Domingos Maria Frutuoso seguiu para Toulouse, onde se manteve até 1897, ano em que regressa a Portugal e professa solenemente nas mãos de frei Pio Mac Alliney, Superior da Casa do Corpo Santo, a 16 de Outubro.
Durante o tempo em que viveu em Toulouse frei Domingos pôde aprofundar os seus conhecimentos sobre São Tomás e entrar em contacto com eminentes teólogos, alguns deles discípulos imediatos do Padre Lacordaire, de quem frei Domingos falará sempre com muita veneração.

Ilustrações:
1 – Fotografia D. frei Domingos Maria Frutuoso, possivelmente de 1921.
2 – Fotografia do Padrão de Santa Iria na Ribeira de Santarém.
3 – Fotografia da igreja e Seminário Patriarcal de Santarém no século XIX.
4 – Digitalização da primeira página de “O Facho”, de Setembro de 1949.
5 - Digitalização da fotocópia do Assento da Profissão de frei Domingos Maria Frutuoso.

2 comentários:

  1. Frei José Carlos,

    Um grande obrigada pelo texto que elaborou sobre Frei Domingos Maria Frutoso – Infância e Vocação Dominicana, na sequência do Encontro da Família Dominicana na Ribeira de Santarém.
    Como Frei José Carlos afirma só é possível saber o que testemunham os documentos. Bem-haja.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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  2. Frei José Carlos,

    Muito grata,por toda esta riqueza deste belo texto que partilhou connosco.Quem não teve oportunidade de estar presente neste encontro da Família Dominicana,tem o prazer de ler este excelente texto e maravilhar-se com algumas fotografias com que tem ilustrado os dois textos que muito gostei.Obrigada,Frei José Carlos,com o seu belo trabalho com que nos presenteou neste fim de semana.Bem-haja.Que o Senhor o proteja e o abençõe.
    Um abraço fraterno,
    AD

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