terça-feira, 15 de maio de 2012

Ninguém me pergunta “para onde vais”! (Jo 16,5)

Depois de tantas confusões, de tantas outras perguntas, Jesus confronta agora os discípulos com o silêncio a que se remeteram, um silêncio que denuncia um desalento, uma incompreensão, uma desorientação face ao futuro e às expectativas.
Pedro já antes tinha perguntado a Jesus para onde ia (Jo, 13,16) e Tomé tinha deixado essa questão subjacente quando tinha dito a Jesus que não sabiam para onde ia como poderiam saber o caminho (Jo 14,5).
Contudo, agora que Jesus lhes diz que terão que sofrer perseguições, que serão expulsos das sinagogas e que ele regressa àquele que o enviou, nenhum deles tem a coragem e a ousadia de lhe perguntar para onde vais.
É como se houvesse um desinteresse, como se uma frustração tremenda se tivesse abatido sobre eles, pois aquilo pelo qual tinham esperado parecia que se esvanecia no horizonte, tudo se conformava para algo totalmente diferente. Como nos diz São João, o coração encheu-se-lhes de tristeza.
Estas questões e este silêncio revelam no entanto a complexidade do discurso de despedida de Jesus, a incompreensão por parte dos discípulos face ao que Jesus lhes anunciava e se perspectivava. De facto era algo totalmente novo, uma verdadeira revolução para a qual eles não estavam ainda preparados, e que os ultrapassava na sua compreensão.
Mas, e como Jesus diz, é necessário que ele parta, é necessário regressar ao Pai, e sobretudo é necessário que os discípulos compreendam que isso não significa uma perda mas pelo contrário a oportunidade e a possibilidade de verdadeiramente o compreenderem.
De o compreenderem no mistério da encarnação e na sua divindade, do que tinham vivido com ele durante aquele tempo de tantas expectativas, mas sobretudo de o compreenderem no sentido da desapropriação, no sentido de um relação completamente livre e que pode ser estabelecida em qualquer lugar, em qualquer momento e em qualquer circunstância.
A proposta de Jesus é a do afastamento da idolatria da sua pessoa, porque, ainda que Deus, é o seu Pai e nosso Pai que deve ser adorado, foi dele que procedeu e é a ele que regressa para que todos possamos regressar também. Jesus é a imagem do Pai, a manifestação salvadora do Pai.
Neste sentido, a resposta que tinha dado a Tomé “eu sou o caminho, a verdade e a vida”, revela-nos e convoca-nos a uma relação fundamental com o Pai, pois Jesus tudo aponta e encaminha para o Pai. A sua vida e tudo o que ensinou aos discípulos são apenas uma forma exemplar de como estabelecer essa relação.
Arrisquemos pois seguir Jesus na relação que ele estabeleceu com o Pai, uma relação que como nos ensinou é filial, funda-se no amor mútuo.

Ilustração: Cruzeiro junto ao Arroyo de Sambol, entre Hornillos del Camino e Hontanas. Caminho de Santiago. 11 de Maio de 2010.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    ...“ como Jesus diz, é necessário que ele parta, é necessário regressar ao Pai, e sobretudo é necessário que os discípulos compreendam que isso não significa uma perda mas pelo contrário a oportunidade e a possibilidade de verdadeiramente o compreenderem”, pode ler-se no texto da Meditação. … Porém, Cristo não se afastou de nós, permanece espiritualmente entre nós para sempre, esta é a nossa esperança, Frei José Carlos.
    Bem-haja por nos salientar que ...” A proposta de Jesus é a do afastamento da idolatria da sua pessoa, porque, ainda que Deus, é o seu Pai e nosso Pai que deve ser adorado, foi dele que procedeu e é a ele que regressa para que todos possamos regressar também. Jesus é a imagem do Pai, a manifestação salvadora do Pai.
    Neste sentido, a resposta que tinha dado a Tomé “eu sou o caminho, a verdade e a vida”, revela-nos e convoca-nos a uma relação fundamental com o Pai, pois Jesus tudo aponta e encaminha para o Pai. A sua vida e tudo o que ensinou aos discípulos são apenas uma forma exemplar de como estabelecer essa relação.”…
    No nosso peregrinar peçamos ao Senhor que aumente a nossa fé e oremos para que o Defensor venha de novo.
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha, profunda, que nos esclarece e encoraja. Que o Senhor o abençoe e proteja.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe um poema de Frei José Augusto Mourão, OP


    venha o defensor


    Deus,/defende a nossa vida contra os preconceitos do mundo,/conduz-nos para a inteligência da verdade/
    que não separe a noite da madrugada/a morte e o riso//

    venha o teu Espírito de doce persuasão/convencer-nos que o inimigo deste mundo/foi condenado/ e que o mundo
    pode erguer-se/e recomeçar a andar/convença-nos o teu Espírito/que o único pecado/é não acreditar em Jesus Cristo//

    venha o Defensor/rememorar a palavra já ouvida,/a corrente que dorme sem defesa/no turbilhão da letra e do sentido//

    venha a Palavra aberta e definitiva/dizer que a morte não ensina/mas se conta e se transgride/de contar-se//

    venha o teu Espírito ensinar-nos/o novo uso da Palavra/a sua fronteira e a sua fonte,/Deus, Palavra primeira de que o
    Filho testemunha/e nós acreditamos


    (In, “O nome e a Forma”, Pedra Angular, 2009)

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