quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Homília da Solenidade da Assunção da Virgem Maria

Ao celebrarmos a Solenidade da Assunção da Virgem Maria ao céu não podemos deixar de associar este mistério da história da salvação ao que nos é relatado pelo Primeiro Livro das Crónicas, quando nos conta a trasladação da arca da Aliança para o lugar preparado por David, e que pudemos escutar na celebração da Vigília desta Solenidade.
A leitura do Livro do Apocalipse, que escutámos como primeira leitura desta celebração do dia, faz também essa associação e assim imediatamente ao aparecimento da arca no templo se liga o sinal grandioso da mulher revestida de sol e com a lua debaixo dos pés.
Esta associação, e invocação como encontramos na Ladainha de Nossa Senhora, é de facto significativa, porque se na caminhada no deserto a arca encerrava e transportava em si as tábuas da Aliança que Deus tinha estabelecido com o povo que tinha libertado do Egipto, no seio de Maria foi também transportada a tábua da Nova Aliança, a prova irrefutável da solicitude de Deus para com a humanidade.
E se a prova documental, se assim se pode falar, da Aliança de Deus com o povo de Israel era uma realidade material, inerte, e portanto possível de ser transportada numa outra realidade também material e inerte como a arca, o testemunho da Nova Aliança de Deus como vida e potencialidade de vida somente podia ser transportada em outra realidade viva como o seio de Maria.    
Consequentemente, se a Arca da Aliança, com as tábuas da Lei, ao ser tocada provocava a morte daqueles que lhe tocavam, ainda que fosse de forma acidental como aconteceu com Uzá, a arca da Nova Aliança é potenciadora de vida, é facilitadora de vida àqueles que lhe tocam por acidente ou por devoção.
São Paulo na Carta ao Coríntios não deixa de nos colocar diante deste mistério vivificante quando diz que “se todos morreram em Adão também todos são restituídos à vida em Jesus Cristo”. A vida de Jesus, o seu potencial vivificador alcançou a Virgem Maria no momento em que aceitou o convite para ser mãe do Filho de Deus, e portanto um e outro estão interligados inseparavelmente na vida gerada, e na oferta de vida feita aos homens por parte de Deus.
Por causa desta vida que transporta em si, quando a Virgem Maria visita a sua prima Isabel o menino que será o profeta João exulta no seio de sua mãe, alegra-se pela vida que vem ao seu encontro e do qual também ele será beneficiário.
Ao celebrarmos hoje com alegria o mistério da Assunção da Virgem Maria ao Céu associamo-nos e partilhamos a alegria de João quando exultou no seio de sua mãe, mas igualmente a alegria de David quando introduziu a Arca na cidade da Jerusalém. Não é já um objecto que nos intimide, como intimidou David quando Uzá tocou a arca e foi ferido de morte, mas uma pessoa que participa e partilha da vida que nos foi oferecida e portanto nos dá confiança e esperança.
A assunção da Virgem Maria ao céu é o sinal e a garantia de que a vida recebida da fonte da Vida, a vida vivida em Jesus Cristo e por Jesus Cristo, é irrevogável, é imparável, não é passível de corrupção ou degradação, e portanto todos os que dela e nela vivem estão destinados à assunção ao céu, à partilha da vida divina na eternidade.
Neste sentido, não podemos deixar de assumir que tal como a Virgem Maria estamos igualmente convocados e convidados a ser outras Arcas de Aliança, a viver de tal modo em união e intimidade com Deus que possamos ser veículos de esperança e confiança na vida para os homens que se encontrem connosco.
Que a Virgem Maria interceda por nós, para que tal como ela possamos cantar, “ o Senhor fez em mim maravilhas, Santo é o seu nome”.

Ilustração: “Assunção da Virgem Maria”, de Mateo Cerezo, Museu do Prado, Madrid.


2 comentários:

  1. Quão profunda é mais esta homilia que connosco partilha, Frei José Carlos, vindo ao encontro da necessidade que temos da compreensão dos textos do AT, interligando-os simultaneamente com os do NT.
    Ao mesmo tempo, a oração que nos sugere de louvor ao Senhor pela invocação de Sua Mãe e de agradecimento pelo Bem experimentado pela união com Eles,faz-me invocar Santa Teresa de Ávila: "Nada te turbe, nada te espante... só Deus basta". É para mim tão reconfortante que a tenho sempre presente, recitando-a também aos que se sentem presos às peias do sofrimento físico e moral.
    Tenha uma santa noite,
    GVA

    ResponderEliminar
  2. Frei José Carlos,

    No dia em que celebrámos com alegria a Assunção da Virgem Maria ao céu, recorda-nos que este mistério “é o sinal e a garantia de que a vida recebida da fonte da Vida, a vida vivida em Jesus Cristo e por Jesus Cristo, é irrevogável, é imparável, não é passível de corrupção ou degradação, e portanto todos os que dela e nela vivem estão destinados à assunção ao céu, à partilha da vida divina na eternidade e (…) a viver de tal modo em união e intimidade com Deus que possamos ser veículos de esperança e confiança na vida para os homens que se encontrem connosco”…
    Peçamos como nos convida “à Virgem Maria que interceda por nós, para que tal como ela possamos cantar, “ o Senhor fez em mim maravilhas, Santo é o seu nome”.”
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homilia, profunda e bela, que teceu no dia da Solenidade da Assunção da Virgem Maria, pela força que nos transmite.
    Que o Senhor o abençõe e o guarde e a Virgem Maria nos ajude e conforte nas horas mais difíceis quando vacilamos, quando no sentimos mais fragilizados.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

    ResponderEliminar