Um jovem vem ao encontro de Jesus, um jovem que parece procurar algo
mais na vida, pois quer saber o que de bom pode fazer para possuir a vida
eterna.
A conversa com Jesus mostra-o já no bom caminho, pois, à apresentação
dos mandamentos da lei por parte de Jesus, contesta que tudo isso tem guardado,
que tem sido um fiel cumpridor da lei.
Ainda assim aspira a mais, sente que há qualquer coisa que lhe falta
ainda, e perante tal desejo Jesus não pode deixar de lhe apresentar o seu
projecto, a novidade do seu projecto, “vai vender o que tens, dá-o aos pobres e
segue-me”.
A proposta de Jesus não teve no entanto acolhimento, apesar do desejo
de mais, de algo de diferente por parte do jovem. Diz-nos o evangelista que o
jovem se retirou porque era muito rico, tinha muitos bens.
Podemos interrogar-nos sobre a natureza da riqueza deste jovem, se era
uma riqueza verdadeiramente material, ou pelo contrário uma riqueza resultante
da sua auto-suficiência, da auto-suficiência do cumprimento da lei e dos
mandamentos.
A proposta de Jesus, a oferta que ele faz ao jovem e a cada um de nós,
é uma proposta que vai para além da lei, do cumprimento dos mandamentos. A proposta
de Jesus é uma proposta de vida e por isso em outro momento e outra conversa
Jesus dirá que não veio abolir a lei mas completá-la.
De facto não interessa a Jesus o fiel cumprimento dos mandamentos, a
sua perfeita execução, quando lhes falta a vida, quando lhes falta o amor. Os mandamentos
vividos dessa forma serão apenas uma fachada, um proforma, um exercício que
conduz à tranquilidade da consciência e da auto-suficiência. Eu fiz, eu cumpri.
A proposta de Jesus exige um abandono da segurança, o abandono de uma
contabilidade que leva à suficiência e à justificação. A proposta de Jesus
exige a liberdade da vida, o amor pela causa ou pela obra, uma segurança que
não nos é dada por nós mas pela graça de Deus, pela certeza da sua presença e
do seu apoio face à nossa pobreza e humildade.
Procuremos pois libertar-nos do espirito de contabilidade e suficiência
do cumprimento dos mandamentos, e viver na nossa pobreza e fragilidade, nas
nossas limitações humanas, a radicalidade da liberdade e do amor que Jesus nos
oferece como caminho para a vida perfeita.
Ilustração: “Baptismo de Vajk, Estevão I da Hungria”, de Gyula Benczur,
Galeria Nacional da Hungria.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarLeio o texto da Meditação e fico a reflectir no que nos transmite, procurando saborear nas palavras e nas entrelinhas a espiritualidade profunda, o realismo, talvez o desafio, mas também a beleza das mesmas.
Como nos afirma ...” não interessa a Jesus o fiel cumprimento dos mandamentos, a sua perfeita execução, quando lhes falta a vida, quando lhes falta o amor. (…)
(...) A proposta de Jesus exige a liberdade da vida, o amor pela causa ou pela obra, uma segurança que não nos é dada por nós mas pela graça de Deus, pela certeza da sua presença e do seu apoio face à nossa pobreza e humildade.” …
Grata, Frei José Carlos, pelas palavras partilhadas, pelo convite que nos faz …” a libertar-nos do espirito de contabilidade e suficiência do cumprimento dos mandamentos, e viver na nossa pobreza e fragilidade, nas nossas limitações humanas, a radicalidade da liberdade e do amor que Jesus nos oferece como caminho para a vida perfeita”.
Que São Bernardo nos ilumine e o seu exemplo de vida nos guie no nosso peregrinar.
Bom descanso.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe de novo o texto de uma oração, porque é intemporal, faz parte dos nossos diálogos com Deus, porque as balbuciamos com fé e confiança.
O TEU AMOR
QUE NOS ACEITA
POR INTEIRO
Rezo nesta manhã o Teu amor, ó Deus. O Teu amor que nos aceita por inteiro, que abraça
o que somos e o que não somos; o que nós fomos e o que nos tornámos. O Teu amor que
ama as nossas possibilidades infinitas e indefinidas; os nossos desabrochares esperançosos
e as nossas quedas frustantes; as nossas liberdades insensatas e a nossa timidez hesitante.
O Teu amor ensina-nos a confiança e continuamente relança a nossa história.
(In, Um Deus Que Dança, Itinerários para a Oração, José Tolentino Mendonça, 2011)