Conta-nos Diogo do Couto,
na sua Vida de D. Paulo de Lima Pereira, um acontecimento bastante interessante,
e certamente pouco conhecido, que nos revela o culto prestado ao Beato Pedro
Gonçalves, mais conhecido por São Telmo, na cidade de Lisboa do século
dezasseis.
No ano de 1556,
estando tudo organizado para a armada partir para a India, a nau Santa Maria da
Barca, na qual iria o capitão-mor da armada Dom Luís Fernandes de Vasconcelos,
filho do Arcebispo de Lisboa Dom Fernando de Menezes, começou a meter água.
O rombo era tão grande
que rapidamente a nau alcançou catorze palmos de água, razão para se despejar e
revolver todo o interior de modo a encontrar a origem de tamanha desgraça. Por
causa deste acidente, e ainda que sendo a nau capitã da armada, ficou junto ao
cais enquanto todas as outras partiam rumo à India.
Nas gentes da ribeira,
pescadores e navegadores, rapidamente começaram a circular os boatos e os
burburinhos aumentavam, pois por mais voltas que dessem à nau não havia meio de
encontrar o ponto de infiltração da água que impedia a nau de partir.
Nasceu assim a ideia que
tal acontecia por castigo de Deus, para castigar o capitão-mor que era filho do
Arcebispo, o qual tinha proibido nesse mesmo ano as tradicionais e ancestrais festas
que se faziam em honra de São Pedro Gonçalves, São Telmo.
O Arcebispo de Lisboa
Dom Fernando de Menezes proibira aquilo que considerava como uma superstição. Na
véspera da festa costumavam os pescadores vestirem-se de gala, com as melhores
roupas, os cordões de ouro, e ao som de música e bailes, carregados de fogaças,
levavam a imagem do Santo até às hortas de Xabregas, onde passavam a tarde em
grandes folguedos, recolhendo-se ao final da tarde à igreja coroados de
coentros verdes e cingidos de grinaldas de flores.
Segundo os populares a
proibição das festas a São Pedro Gonçalves estava na origem da desgraça da nau,
a qual só teria fim quando as antigas cerimónias fossem permitidas. Foi o filho
e os companheiros de viagem que se dirigiram ao Arcebispo para que terminasse
com tal ofensa ao Santo tão querido aos navegantes e marinheiros.
Diante da devoção, e
certamente da vergonha de ver que apenas a nau do seu filho não partia para a
India, Dom Fernando de Menezes revogou a proibição das festas populares a São
Pedro Gonçalves. Imediatamente um marinheiro encontrou o furo que um prego na
quilha não calafetado tinha provocado.
Graças a este acidente
e milagre não só a nau não se perdeu, pois em alto mar nenhum remédio teria,
como a devoção e as festas em honra de São Pedro Gonçalves saíram reforçadas e
reconhecidas pelo prelado maior da Igreja de Lisboa.[1]
Ilustração: São Pedro
Telmo na igreja de São Caetano em Santiago de Compostela.
[1] Diogo do
Couto, Vida de D. Paulo de Lima Pereira, Lisboa, Escriptorio, 1903, páginas 16-20.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarLi com muito interesse o texto que nos conta a história ao Culto a São Pedro Gonçalves,São Telmo,gostei muito de conhecer.Obrigada,Frei José Carlos,pela bela partilha .Que o Senhor o ilumine o abençoe e o proteja.Desejo-lhe uma boa noite e um bom descanso.Bem-haja,Frei José Carlos.Um abraço fraterno.
AD
Frei José Carlos,
ResponderEliminarLi com muito interesse o acontecimento que nos relata sobre o culto prestado ao Beato Pedro Gonçalves em Lisboa. E esta passagem leva-me a reflectir sobre a incompreensão que os decisores a determinado nível revelam sobre o papel importante das festas populares sejam religiosas ou não na vida das comunidades. Pela leitura da História é a conclusão a que podemos chegar e que continua a manifestar-se na actualidade …
Como compreender o responso a Santo António para encontrar objectos perdidos, Frei José Carlos?
Grata, Frei José Carlos, por partilhar connosco o culto a este Santo dominicano, ilustrado com uma bela imagem. Bem-haja.
Que o Senhor o abençoe e o guarde.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva