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Contudo, e pela
riqueza que lhe é intrínseca, não podemos ficar nesta parábola pela leitura no
sentido do próximo, da descoberta do outro que nos solicita compaixão. Há elementos
prévios e posteriores que não nos podem deixar de chamar a atenção.
Assim, e antes de mais,
temos que ter presente a busca do doutor da lei, a pergunta a Jesus sobre o que
fazer para receber a herança eterna. Pergunta que não podemos negar que é comum
a todos nós, porque se os homens e mulheres de fé buscam a felicidade da
herança eterna, aqueles que se dizem sem fé buscam a felicidade da herança neste
momento e neste mundo. Ainda que as respostas sejam diferentes a questão e o
princípio é o mesmo, o homem busca inevitavelmente e incessantemente a sua
felicidade, a sua realização plena.
A resposta de Jesus à
pergunta do doutor da lei é de todos os modos surpreendente pela radicalidade e
pela liberdade que acarreta. Jesus remete o doutor da lei para a lei que
conhece, para o código da Aliança, mas igualmente implica o doutor da lei e a
sua liberdade na leitura dessa mesma lei.
A resposta de Jesus
tem presente os princípios legais, tem presente essa lei de que falava o Livro
do Deuteronómio que não estava nos céus nem para além do mar, mas estava no coração
e perto da boca. Deste modo, e pela proximidade do homem, essa lei era passível
de leitura, de uma leitura pessoal que Jesus convida o doutor da lei a fazer.
Neste sentido, e tendo
presente o convite de Jesus e a apresentação da Lei feita pelo Livro do
Deuteronómio, nenhum homem se pode considerar excluído do cumprimento da lei,
impossibilitado de a viver, porque cada um é convidado a interpretá-la no seu
coração e a colocá-la em prática pela sua inteligência e pela sua confiança no
poder da acção de Deus na mesma lei.
É esta implicação
pessoal que leva o doutor da lei a tentar descomprometer-se quando pergunta a
Jesus quem é o seu próximo. Há no doutor da lei, como há em todos nós, essa
tentativa de encontrar uma justificação para o incumprimento do mandamento do
amor, de encontrar uma desculpa para não nos deixarmos tocar pelo nosso próximo.
Em resposta a tal
pergunta Jesus conta a parábola do sacerdote, do levita e do samaritano,
parábola em que as duas figuras ligadas ao templo são preteridas em favor de um
estrangeiro e de um herege. É aquele que é excluído e marginalizado, o que não
é válido aos olhos dos outros dois, e do doutor da lei a quem Jesus responde,
que assume a atitude mais consentânea com a leitura do mandamento do amor que
anteriormente tinha sido feita pelo doutor da lei.
A parábola remete assim
conscientemente para o mandamento do amor, para a compaixão que somos
convidados a viver face àqueles que sofrem, que são vítimas de violência ou
injustiça. Mas deixa transparecer também a possibilidade do impossível, remete
para o inesperado e o insuspeito que pode acontecer, que se pode tornar
realidade, se nos descentrarmos um pouco de nós próprios, como o fez o
samaritano.
A parábola do bom
samaritano pode ser de certa forma a explicitação prática daquelas palavras que
encontramos na boca de Jesus neste mesmo Evangelho de São Lucas, o que é impossível
aos homens é possível a Deus. Ainda que estas palavras sejam no seu contexto
aplicadas à salvação, podemos também assumi-las aqui e aplicá-las à compaixão e
à misericórdia que tantas vezes nos escapa da mão mas que não escapa da mão de
Deus.
E quando nos assaltam
as desculpas, quando justificamos a nossa distância face ao próximo, temos que
olhar para o final da parábola e perceber que num golpe de génio, numa inversão
cénica de papéis, passámos rapidamente da possibilidade de samaritanos para a
condição de estalajadeiros aos quais foi confiada a guarda do próximo.
Nesta alteração cada
um de nós é o estalajadeiro e o bom samaritano é já o próprio Deus que passa
mais tarde para acertar as contas, para pagar aquilo que tivermos gasto a mais.
E uma vez mais nos deparamos com a lógica do que nos é impossível mas é possível
a Deus, ou seja, o que tivermos ultrapassado ser-nos-á retribuído por Deus,
seremos recompensados cem por um, tal como na promessa àqueles que deixam casas
e família para seguir Jesus.
A parábola do bom
samaritano coloca-nos face ao desafio da compaixão, da descoberta do nosso
próximo e de como eu o faço meu próximo, mas coloca-nos também face ao desafio
do excesso, do impossível aos nossos olhos, mas possível aos olhos de Deus e às
nossas mãos na medida do nosso amor e da nossa confiança total no outro e em
Deus.
Que a confiança no Senhor
que vem para liquidar tudo o que tivermos gasto a mais nos faça ultrapassar os
nossos medos e indiferenças e nos aproxime diligentemente daqueles que são os próximos
que necessitam de nós.
Ilustração: “Bom Samaritano”,
de Johann Carl Loth, Kunstsammlungen Graf von Schonborn, Pommersfelden
Frei José Carlos,
ResponderEliminarLeio com muito interesse o texto da Homília do XV Domingo do Tempo Comum que teceu. Como afirma o Evangelho de São Lucas apresenta-nos uma das mais surpreendentes parábolas de Jesus, a parábola do bom samaritano.
Como nos salienta, …” pela riqueza que lhe é intrínseca, não podemos ficar nesta parábola pela leitura no sentido do próximo, da descoberta do outro que nos solicita compaixão”... Porém, vou centrar-me na parábola de Jesus.
Como nos recorda …” A parábola remete assim conscientemente para o mandamento do amor, para a compaixão que somos convidados a viver face àqueles que sofrem, que são vítimas de violência ou injustiça. Mas deixa transparecer também a possibilidade do impossível, remete para o inesperado e o insuspeito que pode acontecer, que se pode tornar realidade, se nos descentrarmos um pouco de nós próprios, como o fez o samaritano.”…
Não se trata de saber previamente quem é o meu próximo. Não se tem um próximo. Não está definido à partida como Jesus o demonstrou, nem quem é, nem a que círculo pertence. O importante é a minha disponibilidade para o encontro com esse alguém, de quem me faço próximo e que contrariamente ao que podemos pensar, desde sempre, mas particularmente na actualidade, o que precisa, algumas vezes, não são bens materiais, o cuidado do corpo, mas do espírito e de afecto, de ternura, de um gesto de fraternidade, de partilha de tempo, de alguém que escute. O meu próximo é de quem me aproximei.
Façamos nossas as palavras de Frei José Carlos e peçamos … “Que a confiança no Senhor que vem para liquidar tudo o que tivermos gasto a mais nos faça ultrapassar os nossos medos e indiferenças e nos aproxime diligentemente daqueles que são os próximos que necessitam de nós”.
Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homília, profunda, maravilhosamente ilustrada, que nos ajuda a descentrar de nós próprios, por recordar-nos que …” A parábola do bom samaritano coloca-nos face ao desafio da compaixão, da descoberta do nosso próximo e de como eu o faço meu próximo, mas coloca-nos também face ao desafio do excesso, do impossível aos nossos olhos, mas possível aos olhos de Deus e às nossas mãos na medida do nosso amor e da nossa confiança total no outro e em Deus.”…
Que o Senhor o abençoe e o proteja.
Bom início de semana.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
"Coração em Deus, e Mãos ao Trabalho". Costumamos confiar em Deus, quando através dele rezamos, mas Deus é além disso o Nosso Melhor Amigo. O Amigo Incondicional de Todas as Ocasiões, que nos leva por um Bom Caminho e nos Corrige quando, não agimos da melhor forma. Com Ele partilhamos Tudo na vida. Ele nos leva à vida Eterna, caso sejamos merecedores. Nos perdoa em caso de arrependimento verdadeiro. Confiança total em Deus, sei por várias razões que é confiança abosluta e verdadeira experiência para toda a vida.
ResponderEliminarSer o estalajadeiro é um desafio que nos é apresentado um pouco sub-repticiamente,envolvendo o possível e o impossível, exigindo a confiança total e a esperança absoluta. Mas temos que tentar!... E.C.
ResponderEliminarFrei José Carlos,
ResponderEliminarGrata,pela bela e profunda Homilia do XV Domingo do Tempo Comum,que propôs para a nossa reflexão.Gostei muito como abordou esta parábola do bom samaritano,do Evangelho de São Lucas.As suas palavras são imprescindíveis,que nos ajudam a estarmos atentos ao nosso próximo,àquele que mais necessita da nossa ajuda.Como nos diz o Frei José Carlos...Que a confiança no Senhor,nos ajude e nos faça ultrapassar os nossos medos e indiferenças e nos aproxime diligentemente daqueles que os nossos próximos que necessitam de nós.Obrigada,Frei José Carlos,pela beleza de Homilia que partilhou connosco.Desejo-lhe uma boa semana e uma boa noite.Que o Senhor o ilumine e gaude e o proteja.Bem-haja.
Um abraço fraterno.
AD