domingo, 28 de julho de 2013

Homília do XVII Domingo do Tempo Comum

A leitura do Evangelho de São Lucas que escutámos começa por nos dizer que os discípulos ao encontrarem Jesus em oração se sentiram impelidos a pedir-lhe que os ensinasse a rezar. O pedido tem como referência João Baptista, é o exemplo que Jesus é convidado a imitar, mas não podemos deixar de assumir que foi certamente a experiência orante e extraordinária de Jesus que levou os discípulos a fazer este pedido.
Tal como acontece com os discípulos, também nós pedimos muitas vezes que nos ensinem a rezar, que nos ajudem a ultrapassar as dificuldades de uma oração que tantas vezes se distrai, que tantas vezes é rotineira, que tão frequentemente é inconstante ou intermitente.
A resposta de Jesus ao pedido dos discípulos e aos nossos é a oração do Pai-Nosso, é o convite a dizer antes de mais Pai que és nosso. Não é uma fórmula mágica, um enunciado de palavras, mas uma proposta, um incentivo a perceber e a viver antes de mais uma relação. A oração de Jesus é uma experiência de intimidade, de confiança, de relação filial amorosa.
A oração que Jesus ensina distancia-se assim da oração que encontramos na boca de Abraão quando pede pelos justos das cidades de Sodoma e Gomorra e da oração que tantas vezes colocamos nos nossos lábios e nasce do nosso coração mas não é ainda fruto do Espirito Santo.
É inegável que a oração de Abraão pelos justos das cidades de Sodoma e Gomorra é um pedido solidário, fraterno, justo, mas também é inegável que a afirmação de Deus de que parte o pedido de Abraão não encerra nenhuma condenação, nenhum extermínio. Deus propõe-se apenas descer às cidades para verificar o clamor que subiu até ele.
Neste sentido, os diversos pedidos de Abraão manifestam antes de mais o drama interior que o aflige e aflige todo o homem enquanto não vive a dimensão filial da oração do Pai-Nosso. Os diversos pedidos de Abraão, face aos justos que podem existir nas cidades, manifesta o drama da fé na fidelidade de Deus. Abraão está preocupado com os justos de Sodoma e Gomorra porque não sabe até onde pode ir a fidelidade de Deus, a capacidade de perdão de Deus, que inevitavelmente o atingirá também a ele como homem que não é perfeito e pode ser injusto.
A oração que Jesus ensina aos discípulos ultrapassa e vence este drama, a oração deixa de estar vinculada a essa expectativa face à fidelidade de Deus sobre os inimigos e sobre o mal. Jesus elimina o medo, o temor face à fidelidade de Deus, e apresenta uma oração que se alicerça na relação confiante e mutua. O homem que reza pode confiar em Deus porque Deus confia no homem.
Esta confiança esbarra contudo, e muito frequentemente, naquela que parece ser o silêncio de Deus face aos nossos pedidos, à nossa oração. Muitos homens e mulheres deixam de rezar porque em determinada situação não encontraram a resposta que solicitavam e esperavam de Deus. Parece que a fidelidade de Deus não corresponde à confiança que se deposita nele.
A parábola do amigo impertinente que Jesus conta aos discípulos depois da oração mostra que a oração do homem nunca deixa de ser escutada, ainda que não nos seja concedido aquilo que pedimos tão insistentemente na oração. Jesus assegura a resposta de Deus, a sua fidelidade, ainda que de uma forma que nos ultrapassa e se nos torna incompreensível.
Percebemos esta incomensurável e incompreensível resposta de Deus quando nos confrontamos com o final da parábola e Jesus nos diz que o amigo se levantará pela insistência ou pela amizade para dar ao outro tudo o que precisasse. Não se trata já de três pães necessários mas de tudo o que fizer falta.
Esta prodigalidade de Deus, esta generosidade, revela-nos que não só Deus não deixa de nos escutar, que há uma resposta abundante de Deus, mas sobretudo revela-nos que mais importante que o obtido, que o alcançado, é aquele que nos alcança e nos oferece. Deus é infinitamente mais precioso, mais valioso, que qualquer dom que nos alcance.
Neste sentido a nossa oração, a oração que Jesus nos ensinou a rezar, é uma participação, é uma configuração filial com Aquele a quem nos dirigimos. Rezar não é mais pedir, ainda que as petições componham o Pai-Nosso, mas é permanecer na presença de Deus, permanecer em íntima união com Ele.
Então o Espirito Santo habitará em nós, e a nossa oração não será mais que o sussurro do amor e a aceitação da vontade do Pai e do bem que nos oferece em cada momento.

 
Ilustração: “Jesus em oração no jardim das oliveiras”, de Sebastiano Conca, Pinacoteca Vaticana.

 

2 comentários:

  1. Quando interiorizarmos que rezar é simplesmente "estar" no Pai, com Ele, confiantes, então,tudo será simples. Mas, como chegar lá? Il n´ est pas si simples comme nous le voulons. E.C.

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  2. Frei José Carlos,

    Como nos recorda no texto da Homília do XVII Domingo do Tempo Comum que teceu …” A resposta de Jesus ao pedido dos discípulos e aos nossos é a oração do Pai-Nosso, é o convite a dizer antes de mais Pai que és nosso. Não é uma fórmula mágica, um enunciado de palavras, mas uma proposta, um incentivo a perceber e a viver antes de mais uma relação. A oração de Jesus é uma experiência de intimidade, de confiança, de relação filial amorosa.”…
    Como põe em evidência no texto a oração é uma relação que cada um de nós estabelece com Deus Pai através de Jesus, conduzida pelo Espírito Santo. É uma relação de proximidade, de confiança em Deus Pai, que habita em nós, que nos Ama, que nos transforma, a quem abrimos o coração, O reconhecemos no outro, a quem questionamos, a quem falamos das alegrias e do que nos preocupa, com as palavras que nos identificam, que nos apresentamos como somos, ainda que Deus saiba quem é cada um de nós, como somos e do que precisamos, mas para que o Espírito Santo nos liberte. Orar não é repetir maquinalmente um conjunto de frases decoradas, recitadas, por vezes, sem grande concentração, cumprir um ritual.
    Temos que reconhecer que não é fácil atingir esta qualidade e intensidade de relação com Deus, Frei José Carlos.
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homília, profunda, que nos esclarece e nos encoraja a prosseguir a Caminhada, por salientar-nos que …” Deus é infinitamente mais precioso, mais valioso, que qualquer dom que nos alcance.
    Neste sentido a nossa oração, a oração que Jesus nos ensinou a rezar, é uma participação, é uma configuração filial com Aquele a quem nos dirigimos. Rezar não é mais pedir, ainda que as petições componham o Pai-Nosso, mas é permanecer na presença de Deus, permanecer em íntima união com Ele.”…
    Que o Senhor o ilumine, o guarde e o abençoe.
    Votos de uma boa semana.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

    P.S. Permita-me, Frei José Carlos que volte a partilhar a Oração do PAI-NOSSO do BREVIÁRIO CALDEU extraída do livro “ UM DEUS QUE DANÇA”, Itinerários para a Oração, Padre José Tolentino, Maio de 2011.


    Pai-Nosso invisível que estais nos Céus/seja santificado em nós o Teu Nome/porque no Teu Espírito Santo,/Tu próprio nos Santificastes.//
    Venha a Nós o Teu Reino/Reino prometido a quantos amam Teu amor./Tua força e benevolência repousem sobre teus servos/aqui em mistério e lá na tua misericórdia.//
    Da mesa que não se esgota/dá alimento à nossa indigência/ e concede-nos a remissão das culpas/Tu que conheces nossa debilidade.//
    Nós Te pedimos:
    Salva aquilo que criastes/E livra-o do maligno que procura o que devorar./A Ti pertencem Reino, Poder e Glória, Ó Senhor.//
    Não prives da tua bondade os Santos!

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