terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Frei Domingos de São Francisco e a sua Biblioteca

A 10 de Julho de 1769 foi emitido um edital pela Real Mesa Censória no qual se ordenava que lhe fossem enviadas relações de todas as bibliotecas particulares que existiam no Reino. Era uma forma de controlar os livros que circulavam no país e também de averiguar a existência daqueles que estavam proibidos e de quem os possuía.
É neste contexto, e dando resposta a esta ordenação, que frei Domingos de São Francisco, residente no Convento de São Domingos de Benfica, envia o seu catálogo de livros pessoais, a seu uso e na sua posse.
Este catálogo torna-se significativo porque é o registo da biblioteca de um frade leigo, um irmão converso, portanto de alguém que não era padre nem tinha feito uma carreira académica. É também o registo da biblioteca de alguém que poucos anos antes, 1764, tinha traduzido para português e editado na Oficina de Francisco Borges de Sousa a “Regra de Santo Agostinho ou Constituições da Sagrada Ordem dos Pregadores, dirigida e ordenada para o uso dos religiosos conversos e conversas da mesma Ordem”, pelo que se compreende-se neste elenco a presença de obras como dicionários e gramáticas da língua portuguesa.
Mas para além destes livros que podemos chamar técnicos, direccionados ao trabalho realizado na tradução, encontramos também aqueles que serviam para o coro e os ofícios litúrgicos, intrínsecos à condição religiosa do possuidor, bem como os que serviriam à sua leitura espiritual. Podemos por eles esboçar um retrato de frei Domingos de São Francisco e dos seus interesses culturais e religiosos.
“Catálogo dos Livros pertencentes ao uso do Irmão frei Francisco de São Domingos da Ordem dos Pregadores, e morador no Convento de São Domingos de Benfica; os quais oferece nesta Real Mesa Censória, em observância do seu Edital.
Larraga, Francisco – Promptuário de la Theologia Moral. Tem 1, em 4º, Lisboa, 1714.
Anónimo – Diferença entre o temporal e eterno. Tem 1, sem princípio, em 4º.
Santa Maria, Frei Agostinho de – Meditações e Suspiros. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1727.
São Francisco, Frei Domingos de – Regra de Santo Agostinho. Tem 20 da mesma matéria, em 8º, Lisboa, 1764.
São Francisco, Frei Domingos de – Regra da Venerável Ordem Terceira de Nosso Pai São Domingos. Tem 300 da mesma matéria, em 9º, Lisboa, 1764.
Leitão, Jorge Barbosa – Monte Líbano Místico. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1737.
Costa, João António da – Finezas de Jesus Cristo. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1762.
Cloche, Fratris Antonini – Officium Beata Maria. Tem 1, de 12º, Roma, 1715.
José, Domingos – Vozes Despertadoras. Tem 1, em 12º, Lisboa, 1765.
Marinis, Joannis Baptista de – Officium Hebdomadae Sanctae. Tem 1, de 12º.
Anónimo – Exercício Quotidiano. Tem 1, sem princípio, e sem era.
Anónimo – Oficio de Nossa Senhora. Tem 1, de 12º, em Amberes, 1725.
Anónimo – Officium Defunctorum. Tem 1, de 12º, Usyssipone, sem era.
Anónimo – Officium Beatae Mariae Virginis. Tem 1, de 12º, Ulyssipone, sem era.
Figueiredo, António Pereira de – Princípios da História Eclesiástica. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1763.
Vieira, António – Arte de Furtar. Tem 1, em 4º, Amesterdam, 1744.
Padilha, Pedro Norberto de Aucourt e – Raridades da Natureza. Tem 1, em 4º, Lisboa, 1759.
Mendes, António Filipe – Gramática da Língua Latina. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1759.
Chorro, Bartolomeu Rodrigues – Curiosas advertências da boa Gramática. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1736.
Fernandes, Domingos – Arte de Figuras. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1743.
Assensio, Francisco – Tercera Parte de la Floresta. Tem 1, em 8º, em Madrid, 1731.
Argote, Jerónimo Contador de – Regras da Língua Portuguesa. 2ª Impressão. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1725.
Vidigueira, Manuel Mendes da – Vida e Fábulas do Insigne fabulador grego Esopo. Tem 1, em 8º, Lisboa, 1684.
Anónimo – Colloquia et Dictionariolum Octo Linguarum. Tem 1, de 12º, Amstelodami, 1631.
Assina: frei Domingos de São Francisco.”
Mais tarde poderemos comparar com outras que também foram enviadas e mostram a diferença de condição e interesses.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    Ainda que tenhamos algumas dezenas de anos de idade, tenhamos vivido poucas décadas em regime de censura, possamos saber um pouco de história, nunca conseguimos imaginar com fidelidade o que foi o passado e o que o presente e o futuro nos poderão reservar.
    O tema que escolheu, a Biblioteca de Frei Domingos de São Franscisco, não podia ser mais supreendente e interessante. Fez-me sorrir pelo inventário e pela ilustração (que me reconfortou). O Catálogo dos Livros é digno de interesse e muitos de nós, com algum tempo, estariamos disponíveis a lê-los e teríamos muito a aprender. Obrigada pela surpresa e partilha. Bem haja.
    Uma abraço fraterno
    Maria José Silva

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