domingo, 22 de janeiro de 2012

Homilia do III Domingo do Tempo Comum

As leituras deste Terceiro Domingo do Tempo Comum não podem deixar de nos recordar, como diz São Paulo na Primeira Carta aos Coríntios, que o tempo é breve, que o tempo é um dom que Deus coloca à nossa disposição para uma alteração na nossa vida, para a conversão do nosso coração ao coração de Deus, para aproveitar a oportunidade de uma ascensão na nossa identidade neste tempo que nos é possível.
Na leitura que escutámos do Evangelho de São Marcos encontramos Jesus junto do mar da Galileia a anunciar que se cumpriu o tempo e está próximo o Reino de Deus, razão para que os que o escutam se convertam e acreditem no Evangelho. É o início da vida pública de Jesus, que no Evangelho de São Marcos, é apenas precedida por treze versículos nos quais se nos conta a missão de João Baptista no deserto, o baptismo de Jesus e de forma breve a experiência das tentações no deserto.
Este anúncio de Jesus, do tempo que se cumpriu, está muito próximo do anúncio que escutávamos na boca do profeta Jonas em Nínive, mas se para os habitantes da grande cidade que levava três dias a atravessar havia quarenta dias para mudar de vida, no caso de Jesus e do seu anúncio a conversão exige-se imediata, é uma urgência, uma vez que o tempo se cumpriu, que a promessa de Deus está em acontecimento.
Face a Jesus não há um prazo para conversão, porque o que se espera, o que Deus espera é o acolhimento, é a aceitação da sua oferta de perdão e amor misericordioso. Por essa razão São Marcos nos relata que quando Jesus passou junto dos barcos e viu Simão e André a pescarem e os convidou a serem pescadores de homens, eles deixaram tudo e seguiram Jesus.
Não houve qualquer hesitação, qualquer discussão, qualquer interrogação sobre as suas capacidades ou sobre a razão do seu chamamento, nem mesmo sobre as consequências de abandonarem tudo e seguirem aquele Jesus que lhes anunciava que o tempo estava cumprido, que estava agora e ali a oportunidade de o aproveitar. Neste sentido São Marcos quer anunciar e convidar-nos à fé daqueles homens que deixaram tudo sem certamente perceberem minimamente o que significava ser pescadores de homens. Também nós somos convidados à mesma radicalidade de fé, pois também muitas vezes o Senhor nos chama através do inusitado e do insuspeito ao seu amor.
Por outro lado este chamamento dos discípulos quer mostrar-nos o apelo à conversão, à adesão e ao seguimento de Jesus, ao acolhimento sem reservas da sua pessoa e do seu dom salvador, que acontece no quotidiano, nas mais diversas circunstâncias da nossa vida. É aí, nesse tempo que temos e é sempre breve, que o Senhor vem ao nosso encontro e se nos oferece como oportunidade de alteração de vida.
Esta dimensão alterante, conversora do chamamento de Jesus, percebe-se no chamamento de Simão e André, mas de forma ainda mais evidente no chamamento de Tiago e João. Se os primeiros deixaram as redes, a sua situação laboral, Tiago e João deixam o pai com os assalariados para seguirem Jesus. O seguimento de Jesus, a adesão ao seu convite, promove-os de assalariados a amigos, altera-os na sua condição e no seu estatuto. Não é sem razão que em outra passagem do Evangelho de São João, Jesus diz que os servos não sabem o que faz o seu senhor enquanto que os amigos o conhecem na intimidade, porque lhes foi dado a conhecer.
O convite de Jesus é portanto um convite a passar dessa situação de assalariado a uma situação de amigo, a um novo estatuto e identidade que deriva dessa partilha da sua mesma intimidade, da aceitação do convite ao seguimento. Face ao tempo, e à necessidade que temos do seu aproveitamento, é de facto urgente que aceitemos o seu convite a partilhar da sua intimidade, a segui-lo para conhecer e gozar do dom do Pai que se nos oferece nele próprio.
Aceitando o seu convite, e a forma como nos transforma e converte, percebemos a dimensão das palavras de São Paulo aos Coríntios quando lhes diz que o cenário deste mundo é passageiro e portanto tudo o que fazemos e vivemos é relativo, insignificante, fora do tempo e da verdade de Jesus Cristo, do seu tempo redimido e redentor e da verdade do seu amor misericordioso. Tudo tem outro sentido à luz da sua pessoa e do seu mistério salvador.
Procuremos pois viver as várias circunstâncias e realidades da nossa vida à luz deste convite que Jesus nos faz de nos encontrarmos com ele nessas mesmas circunstâncias e realidades, para que o seguindo aí e vivendo na sua intimidade nos sintamos resgatados da nossa condição de servos assalariados e elevados ao estatuto de amigos.

Ilustração: “A vocação dos filhos de Zebedeu”, Marco Basaiti, Academia de Veneza.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    O texto da Homília do III Domingo do Tempo Comum que elaborou é profundo, constitui um referencial que nos deve orientar na vida de cada um de nós, cientes que o tempo, é “um dom que Deus coloca à nossa disposição para uma alteração na nossa vida, para a conversão do nosso coração ao coração de Deus”, e é breve, como nos recorda.
    Como nos salienta ...” este chamamento dos discípulos quer mostrar-nos o apelo à conversão, à adesão e ao seguimento de Jesus, ao acolhimento sem reservas da sua pessoa e do seu dom salvador, que acontece no quotidiano, nas mais diversas circunstâncias da nossa vida. É aí, nesse tempo que temos e é sempre breve, que o Senhor vem ao nosso encontro e se nos oferece como oportunidade de alteração de vida.”…
    Permita-me que dê um especial relevo à interpretação que nos oferece das palavras de São Paulo aos Coríntios e que a respigue ...” Aceitando o seu convite, e a forma como nos transforma e converte, percebemos a dimensão das palavras de São Paulo aos Coríntios quando lhes diz que o cenário deste mundo é passageiro e portanto tudo o que fazemos e vivemos é relativo, insignificante, fora do tempo e da verdade de Jesus Cristo, do seu tempo redimido e redentor e da verdade do seu amor misericordioso. Tudo tem outro sentido à luz da sua pessoa e do seu mistério salvador.”…
    Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Homília, profunda, importante e que nos exorta, nas circunstâncias da vida de cada um de nós, a aceitar o …”convite que Jesus nos faz de nos encontrarmos com ele nessas mesmas circunstâncias e realidades, para que o seguindo aí e vivendo na sua intimidade nos sintamos resgatados da nossa condição de servos assalariados e elevados ao estatuto de amigos.” Que o Senhor o ilumine e abençoe.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

    ResponderEliminar