sexta-feira, 9 de março de 2012

Um pai plantou uma vinha (Mt 21,33)

O início da parábola dos vinhateiros homicidas apresenta algumas diferenças nas diversas traduções que existem, e assim tanto podemos encontrar o original grego traduzido por pai de família, como por proprietário ou até por senhor.
Ainda que irrelevante, a questão interessa-nos na medida em que a imagem e estatuto do proprietário da vinha que é arrendada altera as dimensões consequentes da leitura, uma vez que é diferente a relação de um pai de família com a vinha, da relação que mantém um mero proprietário de uma vinha.
Também o crime que os vinhateiros cometem sobre o filho do proprietário adquire outra dimensão se temos em conta que o dono da vinha é de facto um pai de família, pois o crime não atinge apenas a vida do filho mas atinge e destrói a relação, a paternidade.
A parábola que Jesus conta parte assim e inequivocamente da relação de paternidade, há um pai que planta uma vinha, que estabelece uma vedação, que cava um lugar e edifica uma torre. O dono da propriedade que é pai, é alguém que cuida o seu património, que o coloca em posição de rentabilidade para que o filho o possa usufruir e herdar. Há portanto mais que uma mera relação de propriedade nesta parábola, há uma relação de paternidade abrangente que se estende à própria vinha plantada.
Neste sentido, a entrega da vinha aos vinhateiros contratados é uma oferta de participação nessa paternidade, nessa relação que o pai estabelece com o filho através da vinha plantada e cuidada. Os frutos devidos à época da colheita representam a adesão, o acolhimento participativo na herança, e do qual os vinhateiros não têm grande mérito pois tudo lhes foi entregue nas melhores condições para que pudessem produzir os frutos devidos.
A atitude dos vinhateiros não pode assim deixar de nos interpelar, na medida em que também a nós, a cada um de nós, nos é entregue uma parcela da vinha, uma possibilidade de participação na relação de paternidade e na herança patrimonial do Filho. E a responsabilidade é acrescida, uma vez que não nos é entregue uma vinha brava e vandalizada, mas bem pelo contrário uma vinha em que o pai colocou todo o empenho em aprimorar, em a tornar propícia à mesma produção que se deseja.
Podemos e devemos por isso interrogar-nos sobre a forma como estamos a cuidar da nossa parcela de vinha, a fazê-la frutificar e no sentido da parábola perceber como afinal nos estamos a integrar na paternidade que nos é oferecida e na herança que é devida ao Filho mas na qual participamos pelo nosso acolhimento e disposição à colaboração na construção do seu património.
Que o Senhor nos ilumine o coração de modo a acolhermos o nosso trabalho na vinha como filiação e libertação.

Ilustração: “Cristo crucificado na vinha”, placa de estuque pintado da colecção do Victoria and Albert Museum, Londres.

2 comentários:

  1. Frei José Carlos,

    O texto da Meditação que elaborou e ilustrou tão maravilhosamente é profundo e belo. As palavras que Jesus dirigiu aos sumos sacerdotes em forma de parábola, são também dirigidas a nós cristãos que temos a obrigação de fazer frutificar os dons que Jesus nos deu, de avaliarmos em permanência a qualidade da relação com o Pai. Como nos salienta ...” A atitude dos vinhateiros não pode assim deixar de nos interpelar, na medida em que também a nós, a cada um de nós, nos é entregue uma parcela da vinha, uma possibilidade de participação na relação de paternidade e na herança patrimonial do Filho. E a responsabilidade é acrescida, uma vez que não nos é entregue uma vinha brava e vandalizada, mas bem pelo contrário uma vinha em que o pai colocou todo o empenho em aprimorar, em a tornar propícia à mesma produção que se deseja.”…
    Obrigada, Frei José Carlos, por nos ajudar na interpretação da parábola, por nos levar a ...” interrogar-nos sobre a forma como estamos a cuidar da nossa parcela de vinha, a fazê-la frutificar e no sentido da parábola perceber como afinal nos estamos a integrar na paternidade que nos é oferecida e na herança que é devida ao Filho mas na qual participamos pelo nosso acolhimento e disposição à colaboração na construção do seu património”.
    Que o Senhor ilumine e abençõe o Frei José Carlos.
    Votos de bom fim-de-semana.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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  2. Frei José Carlos,

    Agradeço-lhe esta belíssima Meditação da parábola doa vinhateiros homicidas,do Evangelho de São Mateus.muito esclarecedora e profunda que nos ajuda a reflectir com mais profundidade.As suas palavras são imprescindíveis para a nossa Meditação diária.E como nos diz o Frei José Carlos...Que o Senhor nos ilumine o coração de modo a acolhermos o nosso trabalho na vinha como filiação e libertação.Obrigada,Frei José Carlos,pela excelente Meditação que partilhou connosco.Que o Senhor o ilumine e o abençõe e proteja.Bem-haja.
    Desejo-lhe o melhor fim de semana.
    Um abraço fraterno.
    AD

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