quinta-feira, 8 de março de 2012

Um pobre chamado Lázaro jazia junto à sua porta. (Lc 16,20)

As cidades em que a maior parte de nós vive colocam-nos uma questão sobre as portas, sobre as portas junto das quais os pobres Lázaros jazem. Temos as portas das cidades, as portagens das auto-estradas, as portas dos nossos edifícios de trabalho e habitação, as portas que dão para a rua, a porta do elevador e depois a porta de entrada das nossas casas. E ainda aí, temos as portas que nos encerram nos quartos.
Quando franqueamos cada uma dessas portas podemos perguntar-nos se de facto nos abrimos, se a porta é verdadeiramente uma passagem para o outro, ou se pelo contrário, ela é mais uma barreira, uma protecção que, de tanto temermos o outro, nos impede de o contactar, de estabelecermos uma relação.
A parábola que Jesus conta sobre o rico que se banqueteava e o pobre Lazaro que jazia de feridas, diz-nos que este pobre homem se encontrava à porta do rico, ou seja, de cada vez que o rico passava por aquela porta ele tinha a possibilidade de ver Lázaro, de o ajudar, de exercer algum tipo de acção no sentido de minorar aquela situação. Contudo, nada fez.
Após a morte e a constatação dos diferentes locais em que se encontram, o rico pede a Abraão que envie Lázaro avisar os seus irmãos para que não cometam o mesmo erro que ele tinha cometido. A este pedido Abraão responde que têm Moisés e os profetas, tinham já alguém que os avisava e portanto só necessitavam ter atenção, viver de forma diferente da que viviam e ele tinha vivido.
A situação trágica em que se encontra o rico é ainda mais aflitiva na medida em que tomamos consciência do significado do nome de Lázaro, “Deus socorre, Deus ajuda”. Durante a vida do rico, aquele pobre homem sentado à sua porta, com todas as suas chagas e feridas era a oferta da ajuda de Deus, era o socorro ali à mão para a salvação da situação de condenação, e ele tinha-a desperdiçado.
Neste sentido podemos e devemos questionar-nos sobre as nossas atitudes face àqueles que se encontram junto às nossas portas, sobre o acolhimento que temos da possibilidade de salvação que Deus nos oferece. E podemos pensar naquele mendigo que nos estende a mão ao arrumarmos o carro à porta do trabalho, na senhora de idade que mora no prédio vizinho e necessita de alguém que lhe faça as compras, mas podemos pensar também naqueles com os quais nos sentamos à mesa e partilhamos a casa mas que permanecem sem uma palavra de apreço ou de perdão.
Não é sem razão que Jesus diz no Apocalipse que baterá à porta e se houver alguém que lhe abra, ele entrará e comerá, far-se-á presente e salvação. Que o Espírito do Senhor nos ilumine no sentido de não desperdiçarmos essa ajuda de Deus que vem ao nosso encontro através da ajuda que podemos prestar aos outros.
Que as portas franqueadas sejam sempre para o acolhimento do outro e do dom de Deus.

Ilustração: “Lázaro e o rico”, de Gabriel Metsu, Museu de Belas Artes de Estrasburgo.

1 comentário:

  1. Frei José Carlos,

    O texto da Meditação que elaborou e intitulou “Um pobre chamado Lázaro jazia à sua porta (Lc 16,20) leva-nos a reflectir sobre o quotidiano de cada um de nós, sobre os nossos comportamentos, acções, relações que estabelecemos com o nosso próximo, particularmente em situação de dificuldade física ou espiritual. Construímos barreiras em sentido real ou figurado para nos protegemos, para não perdoarmos, para não escutarmos, para nos libertarmos de tudo aquilo que nos pode comprometer, ou que requer tempo para ajudar o nosso semelhante, de tão ocupados que andamos, muitas vezes sem saber avaliar se a falta de tempo é real ou não, seja para a ajuda, ou simplesmente para falarmos, para dialogarmos, para dirigir uma palavra de apreço ou estender a mão ao outro não importa quem, o lugar ou a situação. Certamente é mais fácil julgar, dissimular, do que ajudar. Não acredito que Jesus nos coloque à prova em permanência, porque nos criou livres, mas ao longo da vida somos confrontados com as mais diversas oportunidades para nos transformarmos.
    Como nos salienta no texto ...” A situação trágica em que se encontra o rico é ainda mais aflitiva na medida em que tomamos consciência do significado do nome de Lázaro, “Deus socorre, Deus ajuda”. Durante a vida do rico, aquele pobre homem sentado à sua porta, com todas as suas chagas e feridas era a oferta da ajuda de Deus, era o socorro ali à mão para a salvação da situação de condenação, e ele tinha-a desperdiçado.
    Neste sentido podemos e devemos questionar-nos sobre as nossas atitudes face àqueles que se encontram junto às nossas portas, sobre o acolhimento que temos da possibilidade de salvação que Deus nos oferece.”…
    Façamos nossas as palavras de Frei José Carlos e “Que o Espírito do Senhor nos ilumine no sentido de não desperdiçarmos essa ajuda de Deus que vem ao nosso encontro através da ajuda que podemos prestar aos outros.”…
    Obrigada, Frei José Carlos, pela partilha desta profunda Meditação”, ilustrada com tanta beleza, por nos recordar que…”as portas franqueadas sejam sempre para o acolhimento do outro e do dom de Deus.” Que o Senhor abençõe e guarde o Frei José Carlos.
    Um abraço fraterno,
    Maria José Silva

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