O sábado era para o
povo de Israel o dia do repouso, um dia que recordava e fazia memória do sétimo
dia da criação, o dia em que Deus criador repousou da sua obra.
Com o passar dos anos,
e como acontece com tantas realidades da nossa vida, a rotina foi-se apoderando
da memória, dos rituais que marcavam esse dia e que sequestrados na sua própria
estrutura perderam o sentido.
Assim, o dia de
repouso, o dia da memória da libertação, tornou-se um dia de escravidão e
subjugação, um dia em que o homem se via coarctado na sua liberdade pela
obrigação dos ritos e dos preceitos religiosos.
Num dia de sábado,
caminhando pelas searas, Jesus e os discípulos violaram os preceitos religiosos
daquele dia na medida em que começaram a apanhar espigas. Desta forma, não só
violavam o preceito de não se fazer qualquer trabalho nesse dia como também de
não se andar mais que o estipulado pela lei.
Neste incidente não
podemos deixar de olhar para o lugar em que decorre, a seara, símbolo do povo e
da própria obra de Deus, pelo que a crítica e acusação dos fariseus é ainda
mais insidiosa, denotando um desprezo pela obra de Deus e pela colaboração do
homem nessa mesma obra.
Contudo, Jesus não se
deixa intimidar pela crítica e a acusação, mas aproveita-a para reconduzir os
corações dos homens ao verdadeiro sentido do sábado, porque ele é Senhor do
sábado, ele é também Senhor do descanso do homem.
Neste sentido, Jesus
revela que acima da lei está o homem, que ele não veio para salvaguardar a lei,
para salvar a lei, mas para salvar o homem e salvar a qualidade da sua vida
perdida com o pecado e a liberdade extraviada do seu fim último.
A sua vida, o mistério
da encarnação, a sua paixão e morte, não são para salvar a lei, para controlar
o homem sob um código, mas para o libertar das redes opressoras e conduzi-lo à
verdadeira liberdade, ao encontro do descanso que Deus oferece.
Deus descansou no
sétimo dia da sua obra para a contemplar e ver como era boa, como era bela, e
ao oferecer ao homem o dia de descanso é para que também ele contemple a beleza
da obra de Deus e a beleza da obra das suas mãos quando é feita com amor, com
justiça e com verdade. O dia do descanso é o dia da consciência da colaboração na
obra divina.
Neste sentido, devemos
não só perguntar-nos sobre a forma como vivemos o nosso dia de descanso, como
ele é ou não um momento de libertação, mas também se a nossa conduta, as nossas
acções são orientadas como a acção de Jesus para o encontro com a verdade e a
liberdade que Deus nos oferece no seu projecto e na sua obra.
Como filhos de Deus
estamos também chamados a levar a liberdade aos nossos irmãos, a dar a vida
pela verdade e a beleza do amor de Deus pela sua obra.
Ilustração: “Sonhos”,
de Vasily Polenov, Museus Estatais Russos.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarComo nos salienta no texto da Meditação que teceu ...” Jesus revela que acima da lei está o homem, que ele não veio para salvaguardar a lei, para salvar a lei, mas para salvar o homem e salvar a qualidade da sua vida perdida com o pecado e a liberdade extraviada do seu fim último.”…
E quão frequentemente, Frei José Carlos, vivemos profundamente divididos, sem conseguir ultrapassar as nossas dúvidas sobre o que julgamos que deve ser a nossa actuação fundamentada na relação de intimidade que temos com Deus ou no cumprimento das leis do homem.
Grata, Frei José Carlos, pela partilha da Meditação profunda, maravilhosamente ilustrada, com importantes consequências na nossa vida, pela reflexão a que nos conduz, por recordar-nos que ...” A vida de Jesus, o mistério da encarnação, a sua paixão e morte, não são para salvar a lei, para controlar o homem sob um código, mas para o libertar das redes opressoras e conduzi-lo à verdadeira liberdade, ao encontro do descanso que Deus oferece” ….
Que o Senhor nos dê a sabedoria para discernir o que está certo do que está errado independentemente da lei.
Peçamos ao Senhor que o ilumine, o guarde e abençoe.
Bom descanso.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que volte a partilhar um poema de Frei José Augusto Mourão, OP
do estremecimento
abre os nossos olhos, Deus,/ao impacto da vida que pesa tanto às vezes;/
que a recuperemos desde o horizonte da memória/obscura violenta, verdadeira/
e a inventemos cada dia à força de a sonhar outra;//
e porque os frutos não nascem de apenas os olharmos/ e a ternura é o mais difícil,/
dá ao nosso tempo o dom do estremecimento;//
dá aos nossos olhos a altura dos eucaliptos/ e a comoção das raízes,/
Deus da nossa infância e dos nossos mortos,/
Deus que vens do futuro/em Jesus Cristo e no Espírito/
e nos fazes irmãos na dor e na alegria
(In, “O nome e a Forma”, Pedra Angular, 2009)
Frei José Carlos,
ResponderEliminarAgradeço-lhe as palavras partilhadas do Evangelho de São Marcos,vêm sempre ao nosso encontro,dão força e coragem para prosseguirmos o caminho,com algumas dificuldades difíceis de ultrapassar.Mas todos nós como filhos de Deus,como nos diz o Frei José Carlos,somos chamados a levar a liberdade aos nossos irmãos,a dar a vida pela verdade e a beleza do amor de Deus pela sua obra.Grata,Frei José Carlos,pelas suas palavras partilhadas nesta maravilhosa Meditação,que muito gostei e nos ajudou a refletir,e pela bela ilustração.Continuação de uma boa semana.Que o Senhor o proteja e abençoe.
Um abraço fraterno.
AD