É numa passagem fugaz
pelo posto de cobrança que Jesus se cruza com Levi, um jovem sentado à sua mesa
de trabalho de cobrador de impostos. Sem qualquer apresentação, sem qualquer troca
de palavras, Jesus ordena-lhe que o siga, e Levi levantou-se e seguiu Jesus.
Caravaggio representou
picturalmente na igreja de São Luís dos Franceses em Roma esta cena evangélica,
construindo um ambiente em que a oposição do claro e do escuro é notória.
Do fundo escuro, quase
que meio escondido por outra figura, Jesus aparece estendendo a mão a Levi, num
gesto de apelo que os lábios entreabertos não deixam duvidar. “Tu segue-me”.
No lado oposto, banhado
por uma luz que vem de fora do quadro e passa por cima da figura de Jesus,
encontra-se Levi, recolhido no seu ofício, alheio à presença de Jesus e ao seu chamamento.
Contudo, se Caravággio
representou Levi alheado da presença e do chamamento de Jesus, as figuras que compõem
o quadro não se encontram na mesma situação, e assim para além da mão estendida
de Jesus em direcção a Levi encontramos também outras duas mãos e a surpresa
das duas figuras mais jovens e sentadas à mesa de Levi.
Nelas perpassa a
interrogação sobre o chamamento de Jesus, interrogação que abala o coração do
próprio Levi. É a ele que estás a chamar? É a mim que me estás a chamar?
E podemos imaginar o
que corre veloz nos corações e pensamentos daqueles homens, que no mínimo pode
ser a dúvida de um equívoco. Como pode este Jesus estar a chamar este homem, um
ladrão, um homem que explora o povo e se aproveita do que arrecada para os opressores
e invasores do país?
Levi questiona-se se
não será tudo um erro, se Jesus não se terá enganado na pessoa, porque ele não
é a pessoa indicada, isenta para ser chamada a um seguimento. A sua honestidade
é reduzida e a bolsa que esconde debaixo da mesa prova-o. Se Jesus conhecesse um
pouco da sua vida certamente não o chamaria nem se aproximaria dele.
Mas apesar de tudo isso
Jesus estende-lhe a mão e chama pelo seu nome desde o fundo escuro da sua vida.
Sem saber, sem ter consciência, realiza-se aquilo que Jesus jogará mais tarde à
cara dos fariseus em sua casa. “Eu vim chamar os pecadores, eu vim para os que
estão doentes”.
Neste sentido, não
podemos pois esquecer que Jesus vem ter connosco aos nossos lados escuros da
vida, vem até às nossas doenças e infidelidades, e desde aí nos chama a
segui-lo. E como com Levi, sempre a partir da nossa banca de trabalho, da nossa
realidade quotidiana.
E se no nosso coração
se levanta a dúvida de Levi, a resposta de Jesus não é outra senão: “por isso
mesmo, por tua causa, pela própria miséria em que te encontras e da qual te
quero libertar”.
Jesus não se engana
nos apelos que nos faz de seguimento, ele quer sempre a nossa liberdade, a
possibilidade do acolhimento para o banquete a celebrar em nossa casa; nós é
que nos enganamos quando silenciamos uma resposta ou nos deixamos permanecer nos
nossos lugares.
Ilustração: “A vocação
de Mateus”, de Michelangelo Merisi da Caravaggio, Igreja de São Luís dos
Franceses, Roma.
Frei José Carlos,
ResponderEliminarO texto da Meditação que elaborou e intitulou “Viu Levi sentado no posto de cobrança” (Mc 2,14), seguido pelo chamamento de Jesus,“Tu segue-me”, cujo significado nos oferece através da interpretação da pintura de Caravaggio (Vocação de S.Mateus), é de uma profunda espiritualidade e beleza.
Como nos salienta …” Levi questiona-se se não será tudo um erro, se Jesus não se terá enganado na pessoa, porque ele não é a pessoa indicada, isenta para ser chamada a um seguimento. A sua honestidade é reduzida e a bolsa que esconde debaixo da mesa prova-o. Se Jesus conhecesse um pouco da sua vida certamente não o chamaria nem se aproximaria dele.
Mas apesar de tudo isso Jesus estende-lhe a mão e chama pelo seu nome desde o fundo escuro da sua vida. Sem saber, sem ter consciência, realiza-se aquilo que Jesus jogará mais tarde à cara dos fariseus em sua casa. “Eu vim chamar os pecadores, eu vim para os que estão doentes”.”…
Grata, Frei josé Carlos, pelas palavras partilhadas, de confiança e de esperança, por salientar-nos que …” Jesus não se engana nos apelos que nos faz de seguimento, ele quer sempre a nossa liberdade, a possibilidade do acolhimento para o banquete a celebrar em nossa casa; nós é que nos enganamos quando silenciamos uma resposta ou nos deixamos permanecer nos nossos lugares”.
Que o Senhor o ilumine, o guarde e o abençoe.
Votos de um bom domingo.
Bom descanso.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
Jesus também nos estendeu a mão e nos disse: "Tu segue-me!". Talvez estivéssemos tão distraídos como Levi, mas acabámos por entender e seguimos Jesus.Não sei é se compreendemos sempre que foi por causa das nossas misérias, das nossas dúvidas, das nossas dificuldades, para nos dar a verdadeira liberdade, que Ele nos chamou...
ResponderEliminarFrei José Carlos,
ResponderEliminarAgradeço-lhe esta profunda partilha do Evangelho de São Marcos.Muito esclarecedora,as suas palavras que nos ajudam a meditar mais profundamente.Gostei muito.Como nos diz o Frei José Carlos,Jesus não se engana nos apelos que nos faz de seguimento,ele quer sempre a nossa liberdade,a possibilidade do acolhimento para o banquete.Obrigada,Frei José Carlos,pela bela partilha,e pela beleza de ilustração.Bem-haja.Um bom domingo.Que o Senhor o ilumine o proteja .
Um abraço fraterno.
AD
A dificuldade está em entender o chamamento precisamente a partir da "banca de trabalho", da "nossa realidade quotidiana". Não será que, às vezes, o "extraordinário" é mais fácil de seguir? Inter Pars
ResponderEliminarFrei J.C. Jesus nunca se engana nos apelos que nos faz e nós enganamo-nos quando o seguimos? I.T
ResponderEliminar