A uma semana do Natal eis que nos encontramos com a genealogia de Jesus segundo o Evangelho de São Mateus. Uma longa lista de nomes e filiações que o autor dividiu em três blocos, um primeiro até David com catorze gerações, outro de David até ao exílio na Babilónia também com catorze gerações, e o terceiro do exílio até Jesus filho de Maria.
A longa genealogia é assim interrompida em dois momentos por dois acontecimentos que de alguma forma quebram a sequência, inserem uma outra dimensão e realidade na sequência geracional, o pecado de David com a mulher de Urias e o desterro para a Babilónia, a perda do templo de Jerusalém.
Se relativamente ao primeiro acontecimento a tradição da Igreja sempre viu a assumpção por parte de Deus da infidelidade do homem, simbolicamente representada na infidelidade de David, no segundo acontecimento não podemos deixar de ver a assumpção da abertura e libertação de um único espaço de culto.
Deus assume-se presente fora do templo, acompanhando o povo no seu exílio, passível e possível de encontro fora de uma estrutura construída pelo homem. Aliás, esta ideia torna-se mais clara, mais evidente na medida em que temos presente a promessa de Deus a David quando este se propõe construir um templo em Jerusalém; através do profeta Natan é prometida a David uma casa preparada por Deus para ele e para os seus descendentes.
Jesus, o filho de Maria e descendente de toda esta longa linhagem, é assim a casa de Deus, a casa que Deus promete a David e o templo que o povo pode levar consigo para qualquer exílio, seja na Babilónia, no Egipto ou em qualquer outra terra de escravidão.
Em Jesus, Deus faz-se presença, habitação entre os homens e espaço de habitabilidade dos homens com Deus, faz-se mobilidade e capacidade de acompanhar o homem sem nunca o abandonar, uma vez que também se fez homem. A genealogia mostra essa presença constante e activa de Deus junto dos homens.
Peçamos por isso ao Senhor, que nos envie a Sabedoria do Altíssimo para nos ensinar os caminhos que nos conduzem à habitabilidade de Deus entre nós e connosco.
Ilustração: Árvore de Jessé do claustro do Mosteiro de Silos, Espanha, 2009.
Boa noite Frei José Carlos,
ResponderEliminarAs suas partilhas têm o dom de me esclarecer sobre a Palavra do Evangelho, fazendo luz no que para mim nem sempre é evidente, não só através da clareza dos seus escritos como também pelas ilustrações que os acompanham.E mais uma vez guardo e repito a oração sugerida.
Tenha uma boa noite,
GVA
Frei José Carlos,
ResponderEliminarObrigada pela clareza e significado do texto que partilha sobre a genealogia de Jesus segundo o Evangelho de São Mateus e pela beleza da imagem. Permita-me que respigue algumas das passagens que me tocam e esclarecem.
...” Deus assume-se presente fora do templo, acompanhando o povo no seu exílio, passível e possível de encontro fora de uma estrutura construída pelo homem. (…)
Em Jesus, Deus faz-se presença, habitação entre os homens e espaço de habitabilidade dos homens com Deus, faz-se mobilidade e capacidade de acompanhar o homem sem nunca o abandonar, uma vez que também se fez homem. A genealogia mostra essa presença constante e activa de Deus junto dos homens.”
Façamos nossas as palavras de Frei José Carlos e ...“Peçamos por isso ao Senhor, que nos envie a Sabedoria do Altíssimo para nos ensinar os caminhos que nos conduzem à habitabilidade de Deus entre nós e connosco.”
As partilhas cibernéticas dos textos que vai tecendo, na construção permanente do blogue, são para muitos de nós fonte de esclarecimento, de alimento, temas de reflexão no nosso processo de transformação, um bordão que nos ajuda no nosso peregrinar, de partilha com amigos(as) crentes ou não. Bem-haja por tudo. Que o Senhor o ilumine e proteja.
Votos de um bom domingo.
Um abraço fraterno,
Maria José Silva
P.S. Permita-me, Frei José Carlos, que partilhe um poema de Frei José Augusto Mourão, OP
do estremecimento
abre os nossos olhos, Deus,/ao impacto da vida que pesa tanto às vezes;/
que a recuperemos desde o horizonte da memória/obscura violenta, verdadeira/
e a inventemos cada dia à força de a sonhar outra;//
e porque os frutos não nascem de apenas os olharmos/ e a ternura é o mais difícil,/
dá ao nosso tempo o dom do estremecimento;//
dá aos nossos olhos a altura dos eucaliptos/ e a comoção das raízes,/
Deus da nossa infância e dos nossos mortos,/
Deus que vens do futuro/em Jesus Cristo e no Espírito/
e nos fazes irmãos na dor e na alegria
(In, “O nome e a Forma”, Pedra Angular, 2009)